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A redenção |
Um dia eu sonhei que havia encontrado um homem que me chamava de LINDO ao invés
de GOSTOSO. Que me ligava de volta quando eu desligava o telefone, que se
deitava sob as estrelas para encontrar no silêncio as batidas do meu coração,
ou continuava acordado para me ver dormir.
Naquele sonho o cara me beijava na boca para demonstrar DESEJO, e também me
beijava a testa para demonstrar RESPEITO. Segurava em minha mão na frente de
seus amigos, achando-me o homem mais lindo do mundo, mesmo quando eu estava
doente. O cara que lembrava constantemente o quanto ele se preocupava comigo e
o quanto sortudo era por estar ao meu lado.
Sonhei com um homem que esperou por mim, aquele que virava para os amigos e
falava: É ELE!
Desse sonho eu acordei, olhei para o lado e vi o Leonardo dormindo, respirando
como um anjo, foi ai que dei-me conta de que não se tratava de um sonho. Tudo
aquilo que vivi era real, um conto de fada. Quantas pessoas gostariam de estar
no meu lugar?
Quase todas. Eu que tive a sorte nas mãos, a posse da felicidade, não soube dar
valor, como se abrisse a porta de uma gaiola e deixasse o pássaro voar, para
longe, para sempre.
A vida é mesmo muito injusta. Tudo que o Leonardo me ensinou foi que o amor é à
base da vida, que pode proporcionar alegrias e tristezas. Sei que o dinheiro
compra muita coisa, só não compra sentimento, caráter, conhecimento.
Espero que um dia a inveja seja apenas contos do passado. Espero haver um dia
um mundo sem guerras, sem fome, sem violência. Acredito que a humanidade, cedo
ou tarde cairá em si, porque dependemos um do outro para viver.
Fui levado para o hospital e encaminhado diretamente para a U.T.I, onde
permaneci em coma induzido por dezessete dias. Durante esse tempo, minha
consciência levou-me a uma viagem, torturando-me por todas as maldades que
pratiquei e contribuí.
Todos
os dias eu sentia a presença de minha mãe cuidando de mim, tocando-me. Seu
cheiro pairava no quarto, causando-me uma sensação de paz e alívio tão grande
que não havia palavras para explicar.
Minha
recuperação estava estabilizando-se aos poucos, quando no décimo oitavo dia
ouvi uma voz de criança dizer:
-Olha! Ele está se mexendo!
Meus
olhos se abriram. Ainda entubado e um pouco tonto, pude ver o Leonardo ao meu
lado esquerdo, segurando o Artur no colo e a Giovana à borda da cama. Minhas
lágrimas desciam, sem que eu pudesse dizer uma só palavra.
A
enfermeira entrou no quarto, e entregando o Artur para ela, o Leonardo pediu:
-Por favor, leve eles um pouco lá fora?
-Sim, claro.
Assim
que ela saiu, ele aproximou-se de mim, tocou minha mão e falou:
-Não se entregue... Eu sei que você pode me
ouvir. Procure ficar bem, você está nas mãos de ótimos profissionais. Lute, sei
que você é um vencedor. Prove a si mesmo que é capaz.
Quando
o vi deixando aquele quarto, chorei desesperadamente. Todas as mágoas,
ressentimentos, exteriorizavam-se naquele momento através das lágrimas que
misturadas a diversos sentimentos aliviavam o peso de minha alma.
Um
mês havia se passado. Durante esse tempo permaneci sozinho naquele hospital,
isolado do mundo, refletindo cercado por aquelas paredes brancas e frias.
Sentado
à cama, almoçava um creme de abóbora quando a enfermeira entrou com uma
prancheta na mão questionando:
-Claus?... Posso entrar?
-Pode, claro!
-Como você está se sentindo?
-Bem...
-Que bom! Vim aqui pra te dar a notícia de que
você vai receber alta.
-Hum...
-Não está feliz?
-Sim claro.
-Você tem algum parente para vim te acompanhar?
-Infelizmente não... Sou sozinho nesse mundo.
-Bem... Precisaria que alguém assinasse sua
alta.
-Mas eu não posso assinar?
-Não... Mas vou ver o que pode ser feito nesse
caso, tá?
-Tudo bem.
Após
meu almoço começava a me preparar, quando o doutor entrou no quarto após bater
duas vezes à porta:
-Posso entrar?
-Claro, doutor!
-Vim te dar a melhor notícia do mundo.
-Qual?
-Você já está de alta.
-Obrigado, doutor.
-Claus... Você parece que não ficou feliz com a
notícia...
-A situação em que estou, doutor, estar vivo já
não é uma boa notícia.
-Não diga isso, rapaz. Você é muito jovem
ainda, tem um futuro pela frente...
-De qualquer forma eu lhe agradeço.
-Bem, Claus... Eu te desejo boa sorte e tudo de
bom nessa nova jornada.
-Muito obrigado.
Após
um abraço, ele caminhou em direção à porta e ao abri-la, virou-se para mim
dizendo:
-Ah!... Esqueci de te avisar, tem visita pra
você.
-Visita?
-Sim.
Quando
ele abriu a porta e o Leonardo adentrou ao quarto. Paralisei. Com o lindo
sorriso que só ele sabia mostrar, perguntou:
-O paciente já está pronto para ir pra casa?
-Novinho em folha. - Respondeu o médico.
-Que bom!
Assim
que o doutor deixou o quarto, o Leonardo aproximou-se de mim e falou:
-Vim te buscar.
-Me... Me buscar?
-É... Te buscar.
-Você... Sabe o que realmente está fazendo,
Leo?
-A única coisa que eu sei é que amo você.
Abraçamo-nos.
Em poucas palavras ele conseguiu mudar minha vida radicalmente, e a partir
daquele momento a felicidade havia voltado pra mim.
Depois de tudo que aconteceu, o Leonardo ainda continuava com suas atitudes
nobres, se preocupando comigo. Com ele aprendi que o valor das coisas não está
no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso
existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis
como ele.
A ambição da Talita acabou custando sua vida, mas o bem sempre prevalece sobre
o mal, e o Leonardo conseguiu a guarda de seus filhos. Já o Emerson,
entregou-se à polícia e confessou seu crime, porém, estava solto pela ausência
da prova principal que era o corpo da Vera.
Sei que nada em nossas vidas acontece por acaso, fazendo-me crer que brincar
com os sentimentos dos outros pode custar uma vida.
Tudo que fazemos terá consequências, boas ou ruins, assim como diz a lei da
física, que toda ação gera uma reação. Acontecimentos se repetem, mas não
seguem em círculos, voltando sempre ao mesmo ponto, girando em espirais. Cada
fim é igual a um começo, só que numa dimensão diferente. A lição que tiro de todas
essas experiências de vida?
A pior coisa que se
pode fazer é permitir que alguém se apaixone por você quando não se pretende
fazer o mesmo.
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