segunda-feira, 21 de março de 2016

LIVRO: PROFISSÃO AMANTE - CAPÍTULO 17




| Sentimento suspeito |
  
            À noite não conseguia dormir. Virei de um lado para o outro da cama, mas o sono não vinha. Não sei dizer o porquê, mas já fazia um tempo que eu vinha perdendo o interesse por baladas e sair caçando pessoas para curtir. Talvez fosse pelo fato de enjoar dessa vida promíscua, vazia, ou até mesmo um amadurecimento de pensamento.
Sem ter o que fazer, tive que inventar uma maneira de me distrair. Desci até uma vídeo locadora que funcionava vinte e quatro horas, duas quadras depois do flat. Peguei dois filmes pornô, e antes de retornar pra casa passei no mercado e comprei uma lasanha de micro-ondas, refrigerante e sorvete de chocolate.
            Passei a madrugada inteira assistindo aos filmes, aprendendo mais safadezas e me imaginando aprontando tudo aquilo com aqueles rapazes, além do Leonardo, claro. Todas às vezes que transávamos, algo diferente eu ou ele inventávamos. Nossa vida sexual, desde que a iniciamos, nunca caiu na rotina, e a sintonia que havia entre nós era quase que perfeita.
            No outro dia acordei quase meio-dia. A preguiça era tanta que só levantei da cama para atender ao interfone que tocava escandalosamente.
-Pois não?
-Senhor Claus?
-Eu.
-A senhora Talita está aqui na recepção.
-E o que você está fazendo que ainda não deixou ela subir?
-Desculpe.
Desliguei o interfone, destranquei à portada da sala e voltei para o quarto. Peguei o computador portátil e sentei-me à cama, vestindo apenas uma bermuda. Irada, a Talita bateu a porta após entrar, jogou sua bolsa sobre o sofá e disse parada em minha frente:
-Mas que recepcionista atrevido!
-O que houve? - Questionei querendo rir.
-Esse garotinho insuportável da recepção... Acredita que ele não me deixou subir sem antes interfonar? Absurdo! Eu quem pago essa espelunca todo mês...
-Acalme-se, não é nada pessoal contra você.
Pegando um copo d'água na cozinha, questionou:
-Ah é? Como você sabe?
Dei um sorriso.
-Não me diga que você já... - Falou levando a mão na boca.
-Você sabe que não gosto de perder oportunidades...
-Estou passada!
-Sem drama, Talita. Fale logo a que devo a honra de sua graça? - Questionei ironizando.
-Pouco efeito está surtindo nosso plano do jeito que está.
-Ué... E o que você quer que eu faça?
-Seria interessante e mais eficaz se tivéssemos testemunhas a nosso favor.
-E...
-Vamos fazer com que todos ao nosso redor presenciem situações que possam testemunhar contra ele, ou melhor, a meu favor.
-Você quer que eu trepe com o Leonardo em público?
-Não seja animal! É obvio que ele não concordaria com essa ideia idiota.
-Então?
-Cabe a você criar situações que possam fazer com que os empregados, amigos ou qualquer outra pessoa próxima lhes vejam em atitudes imorais.
-Entendi.
            Sentado à cama, eu teclava com um cara que conheci pela Internet. Ele era louco para sair comigo, convidou-me várias vezes para ir a casa dele, mas nunca chegamos a nos encontrar pessoalmente. No início foi por falta de tempo mesmo, depois, o interesse de minha parte foi se perdendo.
Percebendo que eu estava entretido naquele diálogo, a Talita perguntou:
-Com quem você tanto fala aí?
-Ninguém em especial.
-Deixa eu ver... - Falou aproximando de mim.
-Uau! Que gato!
-Você achou?
-Não vai me dizer que você não?
-Para ser sincero, não.
Segurando ainda o copo d’água, afastou-se de mim dizendo:
-Você está muito estranho, Claus.
-Estranho? Por quê?
-Não sei... Ultimamente você vem se comportando de uma maneira muito bizarra.
-Impressão sua.
-Pois acho melhor você tomar cuidado.
-Do que você está falando? - Perguntei fechando o notebook.
-Não se faça de sonso. Você parece estar apaixonado.
-Apaixonado, eu?
-Sim... Nesse estado, todo mundo perde a graça e apenas uma pessoa começa a fazer sentido para você.
-Você está ficando louca... - Falei levantando da cama.
Cruzando à porta em direção a sala, ela virou-se para mim e falou:
-Escute aqui... Você nem ouse se apaixonar pelo pai dos meus filhos.
-Por quê? Tá com ciúme? - Questionei apoiando meu quadril à pia.
-Não, queridinho... Mas sei muito bem do que uma pessoa apaixonada é capaz de fazer, e isso acabaria atrapalhando nossos planos.
-Eu não seria idiota a esse ponto, né?
-Pela experiência que tenho, fofo, não duvido de mais nada.
-Vamos mudar de assunto?... Por que você quer que eu cause espanto nas pessoas?
-Conselho do meu advogado.
-Esse seu advogado é bem ordinário...
-Questão de sobrevivência. Preciso disso o quanto antes, entendeu?
-Tá bem, vou ver o que posso fazer.
            Pegando sua bolsa de cima do sofá a Talita disse:
-Bem... Agora preciso ir porque tenho reunião de condomínio extraordinária.
-Boa sorte naquela chatice...
-Chatice? Que nada, o foco estará em mim.
-Ué... O que você aprontou?
-Armei um escândalo outro dia porque a síndica barrou a babá dos meus filhos.
-Barrou em quê?
-Não deixou que ela entrasse na piscina.
-E não pode?
-Dessa proibição nem eu sabia. Fiz um escândalo, e hoje será discutido com os moradores do prédio se as babás na condição de empregadas podem acompanhar as crianças dentro da piscina...
-Quanta imbecilidade!
-Fazer o que, né? Mas não irei discutir muito, foi só pra causar polêmica. Comigo é tudo na justiça...
-Sei...
-Juízo, garoto!
-Tchau.
            Assim que ela saiu de casa fui direto telefonar para o Leonardo. Se eu não fizesse logo o que aquela pistoleira estava querendo, encheria meu saco por um bom tempo, e pra mim, quanto mais cedo me livrasse dela e de seu ex-marido, melhor.
-Fala, meu moleque!
-Estou com saudade de você!
-Opa!... É só matar.
-Hum...
-Você está bem?
-Sim e você?
-Sempre fico bem quando falo com o mineiro mais lindo do mundo.
-Podemos marcar de nos vermos hoje a noite?
-Sim. Hoje sairei da clínica por volta das seis da tarde. Vá direto pra casa que nos encontramos lá.
-Tudo bem.
-Beijo nessa boca suculenta.
-Beijo.
            Desliguei o telefone ansioso. Tudo aquilo que havia assistido, ou parte, gostaria de pôr em prática naquela noite, somando com o pedido da Talita para que alguém nos visse “em ação”.
Cheguei lá já passava dás oito da noite. Em minha cabeça estava tudo planejado, passo a passo, e se ocorresse tudo nos conformes, mais uma batalha estaria ganha, e a vontade da Talita realizada.
            Com o cabelo molhado de quem acabava de sair do banho, o Leonardo recebeu-me logo na porta:
-Boa noite!
-Boa noite!
Nos cumprimentamos com um selinho.
-Desculpa pela demora, mas só consegui chegar agora por conta do trânsito.
-Quase morri de saudade. - Disse ele abraçando-me pela cintura.
-Ah é?
-É!
-Então demorô pra gente matar essa saudade...
Pegando em minha mão o Leonardo puxou-me em direção à escada e disse:
-Vem!
Parei dizendo:
-Vá subindo que eu vou beber um copo d'água na cozinha...
-Tô te esperando então.
-Beleza.
            Tolinho, mal sabia ele que tinha o lobo mal dentro do cercado das ovelhas. Até então eu não entendia por que da existência de pessoas que insistiam serem ingênuas, ou então fingem ser. Com minha experiência de vida, aprendi que o mundo é dos expertos, e que somente os fortes sobrevivem.
            Logo quando cheguei à cozinha avistei a Cláudia sentada à mesa, cortando uma maçã em pedaços para consumir aos poucos. Menina tonta! Seu jeito calmo me irritava, mais parecia uma mosca morta.
Encostei a porta bate-volta e aproveitei que ela estava sozinha para por em prática meu plano.
-Claudia! - Exclamei fingindo estar surpreso.
-Boa noite, senhor Claus!
            Ao vê-la levantando-se de onde estava, logo interrompi:
-Não se preocupe, pode continuar sentada...
-Obrigada!
-Eu gostaria de te pedir um favor...
-Pois não?
Apoiando-me sobre a mesa, expliquei:
-O Leonardo não anda muito bem...
-Está doente?
-Não sei, mas estou meio preocupado.
-Em que eu posso ajudar?
-Por favor, depois leve um chá de camomila pra ele no quarto...
-Claro! Levo sim.
-Pra ver se passa a dor de cabeça, coitado...
-Pode deixar que vou preparar e levo para ele.
-Tudo bem... Agora são oito e vinte... Quando for dez horas você leva.
-Tá bom.
-Vou pedir para ele deixar a porta do quarto encostada.
-Ah sim.
-Qualquer coisa eu estarei no quarto de hospedes.
-Tudo bem.
Subi à escada de dois em dois degraus. Entrei no quarto do Leonardo e fechei à porta. Deitado à cama ele já esperava por mim, vestindo apenas uma cueca branca de elastano coladinha, estilo sungão. Que tesão! A forma do seu corpo era perfeita, pele uniforme, lisa, dourada.
Em passos lentos fui aproximando-me e dizendo:
-Se você soubesse o tesão que eu fico quando te vejo de cueca branca...
-Vem matar esse tesão.
            Apoiei o joelho ao colchão e exclamei:
-Safado! Tenho vontade de arrancar essa cueca com a boca.
-Então vem...
Pulei em sua cama e arranquei aquela cueca em segundos. Não demorou muito para que eu também estivesse nu, suado e tinindo de tesão. Nossa sintonia sexual era de arrepiar. Peles em atrito, mãos que se perdiam e se encontravam. O beijo foi selvagem, com muito calor e vontade, e meu pescoço resistia aquelas chupadas tentadoras.
            Sobre a cama já não havia mais nada, pois no clima em que estávamos, travesseiros foram parar longe. Meu cabelo parecia rédeas, puxados a cada fisgada de tesão. Gozamos gostoso, com um moderado grito de satisfação.
            Ofegante, o Leonardo deu-me um forte abraço e acariciou minha face. Esbocei um leve sorriso, dando-lhe um selinho logo em seguida. Ainda deitados, liguei a TV e ficamos assistindo, calados, abraçados, trocando suaves beijos. Pouco tempo depois ele adormeceu. Ao passo que estava indo, meu plano tinha tudo para dar certo, deixando a Talita feliz e livrando minha barra com ela.
Tomando muito cuidado, levantei-me da cama, segui em direção a porta e deixei-a encostada. Deitei-me novamente ao seu lado e joguei o lençol ao chão, fazendo com que nossos corpos, nus, ficassem à mostra sobre aquela enorme cama.
O ar condicionado estava ligado, assim como a TV. Ao perceber que alguém caminhava pelo corredor, abracei o Leonardo e fingi que estávamos dormindo. Quanta maldade! Inocente, a Cláudia bateu à porta, porém, como ninguém respondeu, foi entrando. Segurando uma bandeja ela caminhava em passos lentos. Confesso que tinha a consciência de que poderia chocá-la, mas até então, a prioridade era a resolução do meu problema, e o restante do mundo que se exploda.
Quando a coitada nos viu deitados, abraçados de corpos nus, ficou atordoada. Claro que o que fiz foi uma maldade tanto com ela quanto com o Leonardo, mas nós vivemos em um mundo onde os fracos não sobrevivem, sendo assim, cada um com seus problemas.
Depois de colocar a bandeja sobre a poltrona próxima ao closet, aquela tonta deixou a suíte rapidamente, fechando a porta ao sair. Levantei-me da cama rindo, contente, comemorando o sucesso de mais uma maldade. Minha alegria não durou muito tempo, porque algumas horas depois meu peito foi tomado por uma angústia sem fim.
Ainda deitado, mandei um torpedo para a Talita comunicando-a sobre o sucesso do plano, enquanto o Leonardo dormia, que por sinal parecia estar morto de cansado. Olhando para o teto, permaneci na mesma posição, sem ver o tempo passar, sentindo-me a pessoa mais suja desse mundo.
            Angustiado, segui até o banheiro e fui tomar banho. Não pude evitar que as lágrimas de arrependimento escorressem pelo meu rosto, enquanto a água descia pelo meu corpo, ao mesmo tempo pensava em tudo que aconteceu em minha vida desde a chegada à São Paulo.
Vários questionamentos me fiz, refletindo se valia mesmo a pena destruir a vida de alguém em troca de um pouco de conforto. Minha mãe sempre dizia que a vida era como um espelho, tudo o que fazíamos iria refletir no futuro, por isso a bondade sempre deveria estar à frente.
No outro dia acordei e reparei que o Leonardo não estava na cama ao alisar o lençol. Vesti uma regata e uma bermuda, em seguida desci para tomar café. Caminhei até a cozinha e lá estava ele, sentado à mesa posta com o café da manhã.
            Puxando à cadeira, perguntei:
-Por que não me acordou para descer com você?
-Bom dia, né?!
-Bom dia!
-Você estava dormindo tão gostoso que preferi não te acordar.
-Tem margarina? - Questionei cortando um pedaço de pão.
Colocando o jarro de suco sobre a mesa, a Cláudia respondeu aparentemente constrangida:
-Eu já pego pro senhor.
-Tudo bem.
-Essa noite sonhei que você estava morando aqui. - Disse o Leonardo adoçando seu café.
-Ah é?
-Sim... Morávamos eu, você e as crianças.
-E éramos uma família feliz?
-Muito!
-Eu nunca tive uma família assim...
Toquei em sua mão acariciando-a.
-Aqui está a margarina, senhor Claus. - Falou a Cláudia entregando-me uma faca e colocando o pote sobre a mesa.
-Obrigado.
Após o café, o Leonardo seguiu para seu quarto e vestiu uma bermuda de surfista, pois estava com um moletom. Sem camisa, com um chinelo de dedo e sua cara de safado, nos cruzamos na sala.
Curioso, perguntei:
-Aonde você vai?
-Vou lavar o carro. Quer me ajudar?
-Não, obrigado...
-Então tá.
Liguei a TV da sala e coloquei um DVD para distrair-me um pouco. Comecei a assistir, mas como não era um estilo de filme que me agradava, acabei desistindo.
            Segui até a garagem onde o Leonardo lavava seu carro. Encostado ao batente da porta, cruzei os braços ao peito e perguntei:
-Por que não levou em um lava-rápido? É bem menos trabalhoso...
-Eu gosto de cuidar do que é meu.
-Hum... Ah é? - Murmurei dando uma leve mordida no lábio inferior.
-Sim... Pode pegar aquele balde pra mim?
-Esse com sabão?
-Isso.
Balde pesado! Caminhei alguns passos à frente o segurando, perguntando fazendo careta:
-O que... Eu... Faço?
-Pode jogar o sabão sobre o carro.
-Tá.
Despejei apenas a metade. Segurando a bucha na mão esquerda, o Leonardo disse:
-Joga o resto.
-Tá bom... Calma.
Levantei o balde, mirei no Leonardo e joguei todo aquele sabão sobre seu corpo. Assustei o coitado, que sem entender nada, perguntou:
-O que você fez?
-Nada...
-Também não farei nada...
Nesse momento ele correu até a porta da garagem, fechou-a. Em seguida, pegou a mangueira e começou a me molhar.
-Ah!... Não, pare, tá fria!
-Quer que eu pare? - Perguntou soltando-a.
-Sim.
Encostando seu corpo todo ensaboado ao meu, abraçou e olhou-me por um tempo nos olhos antes de me beijar. Que beijo bom! Fiquei todo derretido. Toquei seu bíceps enquanto o beijava, e segurando minha cintura ele puxava-me para perto dele cada vez mais.
            O sabão facilitou muito no roçar de nossos corpos, principalmente a tirar o pouco de roupas que vestíamos. Enquanto sincronizávamos os movimentos pélvicos, o Leonardo dizia olhando em meus olhos:
-Te amo, meu moleque!
Transamos ali mesmo, sujos de espuma, sobre o capô de seu carro, misturados de suor. Nossos corpos deslizando como se estivessem sobre trilhos, segurados pelas fortes pegadas. Aquela boca parecia que ia me engolir, lubrificando não só minhas mucosas, mas também minha libido.
Esquecemos de tudo, nos fechando em um mundo onde só cabiam nós dois.



Próximo capítulo:      | O pedido sincero |
Dia 22/03



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