| Procurando
por Vera |
Aproveitando o frio de uma sexta-feira chuvosa, fui almoçar em uma churrascaria
no Centro, sozinho. Eu havia ido lá apenas uma vez logo quando cheguei a São
Paulo, mas foi o suficiente para me apaixonar pela comida servida por eles,
principalmente a picanha com salada de maionese, dava-me água na boca só de
pensar.
Quando eu achava que havia encontrado um momento de paz, a Talita sempre dava
um jeito de me encontrar, parece que adivinhava.
-Alô?
-Olá!
Como você está?
-Até
agora eu estava bem...
-Grosseiro!
-Então...
Diga logo o que você quer?
-Quero a
conta e a senha do Leonardo.
-O quê? - Quase engasguei.
-É isso
mesmo que você ouviu. Eu sei que ele tem conta em mais de um banco, mas quero
que você descubra o número da conta e a senha do Banco do Brasil, porque sei
que lá é onde ele tem um valor maior.
-Mas
Talita... Como que eu vou conseguir isso?
-Não sei,
isso é problema seu.
-E pra
que você quer?
-Isso é
problema meu.
-E se eu
não conseguir?
-Nem
preciso dizer onde você vai parar, né?
Antes que eu respondesse, ela desligou. A partir daquele momento eu perdi
totalmente a fome. Deixei a churrascaria e fui dar uma volta pelas ruas,
passando pela Praça da República, e só fui eu cruzar a Avenida Ipiranga em
frente ao Edifício Itália para encontrar a Marcelina, proprietária da quitinete
que eu morava no Edifício Copam.
Querendo me provocar, ela já foi logo dizendo:
-Como
essa cidade é pequena!
-Pois é.
-Sabia
que eu fui atropelada?
-Sério!?
-Sim...
Praga sua.
-Minha,
por quê?
-Porque
você queria que eu morresse.
-Claro
que não.
-Não?
-Não...
Acho que nem o diabo merece a senhora por perto.
Continuei em direção à Biblioteca Mario de Andrade e a deixei falando sozinha.
Tenho que confessar que na hora em que ela revelou ter sido atropelada eu tive
vontade de rir, mas contive minhas emoções e não debochei. Criar atrito com
aquela velha chata não iria me levar a lugar algum, e mesmo tendo me roubado
como fez, não me sentia no direito de acabar com sua moral.
Desci até a Avenida Nove de Julho e peguei o ônibus para voltar pra casa. Meu
peito estava apertado, e uma vontade louca de chorar não me deixava em paz.
Tirei o celular do bolso e liguei para minha mãe, porque ouvir sua voz sempre
me fazia bem:
-Oi Clau!
-Tudo
bem, mãe?
-Tudo, e
ocê?
-Comigo
está tudo ótimo.
-Filho...
No mês que vem eu vô pra São Paulo ficar uns dia ai cocê.
-Sério?
-Sim...
-Nossa!
Eu vou adorar, já estou ansioso, mãe.
-Já disse
pra Jucinéia que eu vô, mas ela não queria deixar não.
-E quem é
ela pra mandar alguma coisa? Pode vim sim, mãe. Eu cuido da senhora...
-Eu sei,
Clau.
-Vou te
levar pra andar de metrô, no Parque do Ibirapuera...
-Sério?
-Sim...
Os ônibus daqui são enormes, mãe... Tem até televisão dentro.
-Nossa!
-Agora eu
vou desligar, porque o ônibus vai entrar no túnel.
-Tá bom.
-Beijo,
mãe.
-Tchau.
Desliguei o telefone feliz da vida, contando os minutos para rever minha mãe e
matar a saudade que eu estava. Não sei se era a distância, mas estava
sentindo-me muito emotivo, coisa que eu não era até então, mesmo com minha mãe
eu mantinha um afastamento de sentimento.
Assim que o ônibus deixou o túnel recebi um torpedo do Leonardo dizendo:
“Meu moleque! Se apronte que vou te buscar
daqui meia hora, arrumei uma entrevista de emprego pra você com um colega meu.”
Que maravilha! Finalmente as coisas em minha vida estavam dando certo. Duas
ótimas notícias fizeram-me sorrir novamente naquele dia, algo que eu já havia
desistido de fazer depois de falar com a Talita.
Cheguei em casa e fui correndo tomar um banho, para quando o Leonardo chegasse
eu já o estivesse esperando, mas minhas contas deram errado, e logo quando eu
saia do banho o interfone tocou:
-Fale?
-Senhor
Claus? O Senhor Leonardo está aqui na recepção.
-Pode
deixá-lo subir.
-Tudo
bem.
Mesmo eu o tendo destratado, o Emerson continuava encanado na minha,
interfonando só para ouvir minha voz.
Corri pro quarto e
vesti a cueca. Deixei a porta da sala destrancada e continuei a me arrumar.
-Hum...
Que cheiro bom!...
- Exclamou o Leonardo caminhando em direção ao quarto.
-É que eu
tomei banho.
-Hahaha.
De frente para o espelho eu atrapalhava-me todo para colocar a gravata. Eu
nunca havia usado aquele negócio antes na vida, e para ser sincero, achava
horrível.
Com seu jeito carinhoso
e ao mesmo tempo másculo, o Leonardo encostou seu corpo por trás do meu,
dando-me um beijo na nuca. Com a mão esquerda ele acariciava minha cintura,
dando alguns apertões, questionando:
-O que
você está fazendo?
- Perguntou pertinho do meu ouvido.
-Estou
tentando dar um nó nessa gravata, mas não estou conseguindo...
-Qual a
dificuldade?
-Todas.
Nunca usei esse negócio...
-Deixa
que eu te ajudo...
Enquanto ele mostrava-me como dar aquele complicado nó, observava através do
espelho, encantado com aquele elegante homem paciente.
-Depois
que você passar aqui, dá uma volta...
-Nossa!
Que coisa difícil...
-Calma,
enrole um pouco mais para baixo...
-Assim?
-Perfeito!
Agora é só puxar...
-Consegui!
-Uau...
Parabéns!
-Obrigado.
-Vai
ganhar um beijo de recompensa.
Virando-me com uma pegada forte o Leonardo começou a me beijar. Ficamos ali nos
beijando por mais de cinco minutos, abraçados, como ele sempre fazia e
deixava-me louco.
Acariciando meu rosto, ele falou:
-Eu tenho
certeza que você irá passar...
-Obrigado
pela força.
-Eu amo
você!
Minha vontade era de
dizer o mesmo, mas não consegui. Se eu dissesse, estaria sendo falso, e o
Leonardo era um cara bom, não merecia ser enganado.
-Agora
vamos que se não você irá se atrasar.
-Deixa eu
passar um pouco de perfume...
-Não
passe demais pra não irritar os outros... Vou te esperar no carro.
-Você vai
me deixar no metrô?
-Não...
Vou te levar até a empresa.
-Você é
tão legal comigo que às vezes chego a me sentir mal... Até mesmo me questiono
se mereço você...
-Pare com
isso... Você merece muito mais.
Antes de sair, olhei-me ao espelho mais uma vez, ajeitei a gravata, arrumei o
cabelo e tranquei à porta. O Leonardo já aguardava por mim dentro do carro.
Enquanto esperava pelo elevador, meu celular tocou:
-Alô?
-Que
demora!... Cadê você?
-Estou
aguardando o elevador...
-O que
acha de descer pela escada?
-Tô indo.
Desci correndo e em menos de cinco minutos eu já estava dentro de seu carro.
Respirei fundo e coloquei o cinto. Após acionar as travas, o Leonardo subiu os
vidros e deu partida.
Seguíamos para a
empresa onde aconteceria à entrevista, quando seu celular começou a tocar. Como
ele estava dirigindo não poderia atender, sendo assim, atendi por ele:
-Atende
pra mim, meu moleque?
-Sim...
Alô?
-Alô...
Quem está falando?
-É o
Claus.
-Mas o
que você faz com o celular do Leonardo? - Perguntou a nojenta da Talita.
-Quem
gostaria de falar com ele? - Questionei tentando disfarçar.
-Você
sabe quem está falando. Passe logo esse telefone pra ele.
-É que no
momento ele está dirigindo.
Curioso, o Leonardo quis saber:
-Quem é?
-Sua ex...
Talita.
- Respondi tapando o telefone.
Encostando o veículo, ele estendeu a mão dizendo:
-Pode
deixar que eu falo com ela.
-Tá bom.
-Alo?
-Leonardo,
preciso falar sério com você.
-Precisa
ser agora?
-Não.
Mais tarde eu passo na sua casa para conversarmos.
-Tudo
bem.
-Até
mais.
Após um profundo suspiro, o Leonardo desligou o telefone e entregou-me. Percebi
uma certa preocupação em seu olhar. Intrigado, resolvi perguntar:
-Aconteceu
algo?
-Ainda
não sei... Mas sempre que ela me liga, é porque algo ruim aconteceu.
-E ela
não falou o que era?
-Não.
Disse que vai passar em casa para conversarmos.
-Tanto
mistério...
Depois de me deixar no local da entrevista, o Leonardo seguiu para sua casa,
onde iria esperar pela bruaca da mãe de seus filhos.
Pouco tempo depois de estacionar o carro na garagem, a Talita chegou,
acompanhada da babá e sua filha Giovana.
Ao ver a garota, imediatamente o Leonardo questionou:
-Por que
a Giovana não está na escola?
-Esse é o
problema.
- Respondeu acionando o alarme do carro.
-Oi
papai!
-Oi minha
princesa! Vem dar um beijo no papai...
Sorrindo, ela correu para abraçá-lo. Todos entraram na casa. Enquanto a Cláudia
fechava a porta da sala, a Talita falou:
-Cláudia...
Leve a Giovana para brincar no jardim.
-Sim,
senhora. Vamos lá, Gi?
Ainda no colo do Leonardo, ela perguntou:
-Papai...
Eu posso brincar na piscina?
-Pode,
mas não fique muito tempo no sol.
-Tá bom.
-Afff...
Ter pai dermatologista é um martírio...
-Cláudia,
cuide dela e não deixe de passar protetor solar.
-Pode
deixar, doutor.
Enquanto as duas subiram para vestirem-se, a Talita e o Leonardo ficaram na
sala, discutindo problemas familiares.
-Ai que
calor!
- Disse ela sentando-se ao sofá.
-Então...
O que você queria tanto falar comigo?
-Credo!
Não vai nem me oferecer uma água?
-Você
fala como se estivesse na casa de estranho... Andreza!... - Gritou para a
empregada.
-Chamou,
doutor?
-Traga um
copo com água pra Talita.
-Gelada,
senhora?
-Sim, e
com três gotas de limão.
-Certo.
Cínica, perguntou com a maior cara de pau:
-E a
Vera, Leonardo?
-Sumiu.
-Sumiu?
Como assim?
-Não
sei... Simplesmente desapareceu sem dar notícias.
-Que
estranho!
-Estranho
é ter desaparecido um quadro meu no mesmo dia.
-Já
entendi tudo... Que bandida!
-A
polícia já está investigando, mas até o momento nenhuma pista. Então... A que
devo sua ilustre presença? - Questionou o Leonardo ironizando.
-Sem
ironias, Leonardo... Você percebeu que a Giovana está diferente?
-Diferente
como?
-Sei
lá... Notei que ela está estranha. Hoje não quis ir para o colégio, chorou,
grudou na porta do elevador e não soltou mais...
-E foi a
primeira vez?
-Que ela
fez escândalo?
-É.
-Sim, mas
está sempre criando caso pra não ir.
-Ué...
Desde quando está acontecendo isso?
-Não sei,
mas não faz muito tempo. Na verdade, quem percebeu primeiro foi a Cláudia que
logo comentou comigo...
Nesse momento a Andreza apareceu na sala, trazendo a água com limão que a
dondoca pediu. Ao mesmo tempo em que a Giovana e a Cláudia desciam do quarto
para irem à piscina.
-Sua
água, dona Talita.
-Obrigada!
Correndo, a Giovana passou pela sala. Levantando-se do sofá, a Talita colocou o
copo sobre a mesa e disse:
-Bem,
agora eu vou indo.
-A
Giovana vai ficar aqui?
-Sim...
Hoje já é sexta-feira, de qualquer forma ela terá que vir amanhã.
-Então tá.
-Depois
peça para que a Cláudia vá buscar o Artur no colégio e trazer direto pra cá.
-Tá bom.
Após fechar à porta, o Leonardo foi até a raia da piscina, chamou discretamente
a Cláudia e questionou:
-Cláudia...
-Oi?
-A Talita
comentou que você percebeu um comportamento estranho na Giovana...
-Ah! Sim,
é verdade.
Acenando para sua filha, o Leonardo perguntou:
-O quê de
fato?
-Bem...
Toda sexta-feira ela cria caso para não ir ao colégio.
-E que
aula tem às sextas?
-Educação
Física e Matemática...
-Estranho...
Ela sempre gostou dessas disciplinas.
-Pois
é... Reparei também umas marcas roxas em seu braço.
-Hematomas
profundos?
-Não...
De leve, mas que não tem como passarem despercebidos.
-Será que
ela andou brigando com alguém?
-Difícil
pensar isso. Ela é uma menina muito calma.
-Depois
vou telefonar na escola e perguntar pro professor dela.
Enquanto isso, minha entrevista de emprego foi super rápida, pois logo fui
eliminado quando me perguntaram se eu tinha nível superior, e a resposta foi
NÃO. Achei um tremendo preconceito no início, proferi todos os palavrões que eu
conhecia durante o caminho, mas após muito refletir, cheguei a conclusão de que
o culpado da situação era eu mesmo. Aqueles que deixam de se atualizarem,
acabam ficando para trás no campo de trabalho. Sendo assim, eu não tinha o
direito de ficar encontrando culpados pela minha desgraça, quando na verdade a
responsabilidade era toda minha.
Sai daquela empresa arrasado, me sentindo um nada. Telefonei para o Leonardo em
seguida para dar a notícia.
-Alô?
-Oi...
Tudo bem?
-Alguns
problemas, mas nada grave. E você?
-Não
muito bem...
-Que
desânimo é esse?
-Fui
descartado.
-Mas já sabe?
-Sim...
Eles queriam alguém com nível superior...
-Bom...
Acho que você terá que pensar em começar uma faculdade então.
-Mal
tenho grana pra me sustentar.
-Tenta em
uma pública.
-Hahaha...
Você tá me gozando, né?
-Por quê?
-Cara...
É muito difícil...
-Mas não
é impossível. Eu passei, você também pode.
-Depois
pensarei nisso.
-Está
indo pra casa?
-Estou.
-Quer que
eu vá te buscar?
-Não
precisa...
-Tem
certeza?
-Tenho.
-Hoje as
crianças estarão aqui.
-Mas já?
-Sim...
Depois te conto o problema que aconteceu.
-Tá bem.
-Eu quero
te ver hoje mesmo assim.
-Passa em
casa depois.
-Você não
tá legal, né?
-Não muito...
-Já sei!
Vamos em uma balada, dançar, beber um pouco. O que acha?
-Tá
bem...
-Passo em
sua casa mais tarde.
-Tá.
-Então tá.
Um beijo grande nessa boca linda.
-Beijo.
Desliguei o telefone e entrei logo no primeiro ônibus, arrasado, sem rumo. Bem
dizia meu pai que quem não tem estudo, não tem nada, e naquele momento comecei
a temer pelo meu futuro, um destino incerto.
A década de 90 é um
divisor de águas nas trajetórias dos principais indicadores da situação do
trabalho no Brasil. Após cinquenta anos de progressivo aumento no trabalho
assalariado e formalização das relações de trabalho, houve uma drástica
regressão no mercado de trabalho, com aumento de todas as formas de desemprego,
aumento dos vínculos vulneráveis, queda dos rendimentos reais e concentração da
renda. (DIEESE, 2002)
O mercado de trabalho vem mudando cada vez mais rápido, exigindo mais e mais.
Para tudo existe uma solução, porém, é preciso raciocinar antes de mais nada.
Em primeiro lugar, deve-se pensar em qual área quer seguir, traçando um
objetivo. Ninguém se inscreve numa olimpíada sem ter condições de chegar ao
primeiro lugar. Sendo assim, é importante a qualificação na área que se quer
seguir, para assim, encarar o mercado de trabalho por igual.
Passei o resto do dia triste, deitado no sofá olhando pro teto, pensando
naquela droga de vida que eu estava levando, sem perspectivas. Justo naquele
momento em que tudo estava indo tão bem, eis que algo dá errado. Claro que a
opção de mudar estava em minhas mãos, pois acredito que cada ser é dono de seu
próprio destino, e eu tinha que mudar o meu.
O relógio da sala marcava vinte e duas horas. Eu já havia tomado banho e me
arrumado, para quando ele chegasse não precisássemos esperar muito. Apaguei a
luz do quarto. Segui pra sala. Deitei-me ao sofá e continuei aguardando,
ansioso.
Eu não estava muito contente em ir à balada acompanhado. Todo mundo ali já me
conhecia, pois eu era o cara mais rodado daquele lugar, embora já fizesse um
bom tempo que não dava as caras por ali.
Assim que chegou, o Leonardo nem desceu do carro. Mandou-me um torpedo dizendo
que estava a minha espera, e assim que recebi a mensagem no celular, desci para
encontrá-lo.
Entrei em seu carro que estava parado na quadra de cima. Nos cumprimentamos com
um beijo e um apertado abraço. Que delícia! Naquela noite ele estava lindo,
mais lindo do que qualquer outro dia em que nos encontramos. Perfumado, cabelo
arrepiado, parecia mais jovem do que eu.
Chegamos à balada por volta dás duas da manhã, pois no meio do caminho
parávamos algumas vezes para namorarmos um pouco. Safado! Provocava-me o tempo
todo, e eu adorava.
Entramos de mãos dadas.
Confesso que não me incomodei com esse detalhe, pelo menos dessa vez. Pode ser
que não, mas acredito que fiz aquilo por estar acostumado com aquele chato, ou
até mesmo para não contrariá-lo.
Abraçando-me por trás, o Leonardo beijava-me o pescoço, me fazendo arrepiar.
Caralho, que tesão! Naquela noite ele estava muito provocante, safado, uma
delicia. Beijamo-nos por um bom tempo, sentados a uma das mesas no mezanino.
Nem preciso dizer o quanto a balada estava bombando, e claro, os olhares de
algumas pessoas para mim. Para ser sincero nem me importei, fiquei na minha,
aproveitando a boca e as bebidas do Leonardo.
Levantando-me um pouco,
falei:
-Preciso
ir ao banheiro.
-Tá bom.
Enquanto isso vou te esperar lá no bar.
-Tudo
bem.
Desci até o banheiro.
Usava o mictório quando um cara que eu já havia ficado pegou no meu pau
dizendo:
-Saudade
de você, tesão!
Afastei-me na mesma
hora. Encurralando-me à parede, ele perguntou com sua boca próxima a minha:
-Não vai
me dizer que você não sente falta das nossas transas?
Dei-lhe um empurrão
dizendo:
-Deixa de
ser vulgar, garoto... Quer saber? Não sinto um pingo de saudade. Pra falar a
verdade, até me arrependo de ter levado você para minha cama.
Emputecido, gritou:
-Você nem
é tudo isso, seu bosta!
Apoiando-me à porta,
falei antes de sair:
-O dia em
que você me provar sem estar bêbado, terá outra opinião. Mas como esse dia
nunca chegará, fique na vontade.
Dirigi-me ao bar e o
deixei falando sozinho. Ao aproximar-me do Leonardo, notei que um rapaz havia
chegado nele pra trocar ideia. Avancei lentamente, observando atento a sua
reação, que até então, não havia me visto.
-Engraçado,
eu nunca te vi aqui... - Disse o cara aproximando seu corpo ao do Leonardo.
Dando um gole em sua água com gás, o Leonardo respondeu:
-Não sou
frequentador de balada.
-Ah!...
Achei você muito bonito... Interessante.
-Obrigado!
-Qual sua
idade?
-42.
-Hahaha...
Fala sério, vai?
-Eu estou
falando sério...
-Caraca!
Você dorme no formol?
-Por quê?
-Jamais
eu te daria 42 anos... No máximo 30.
-Vou
considerar isso como um elogio.
-Não... É
a mais pura verdade... Não sei por que um cara como você pode estar sozinho.
-Mas eu
não estou sozinho.
-Não?
-Não!
Nesse momento
aproximei-me deles, abracei o Leonardo e falei:
-Voltei,
mô. Demorei?
-Não... - Respondeu dando-me
um selinho.
Puxando pelo seu braço,
perguntei:
-Vamos
pra pista?
-Vamos.
Tocando o ombro do
garoto, o Leonardo disse:
-Tchau...
E boa sorte aê.
Desapontado, ele
respondeu:
-Obrigado.
Seguimos para a pista,
onde dançamos por menos de cinco minutos até voltarmos pro mezanino. O tempo
todo o Leonardo exibia um sorriso no rosto. Até que começou a me incomodar.
Encostando-me ao encosto da cadeira, cruzei os braços e perguntei:
-Posso
saber do que você tanto ri?
-Porque
estou feliz...
-Feliz
com o quê? A cantada daquele cara? - Questionei furioso.
-Não...
Com sua reação de ciúme.
Debrucei-me sobre a mesa e disse:
-Ciúme?
Eu?
-É...
Demonstração de que gosta de mim de verdade...
-Ciúme...
Convencido!
De fato, foi a primeira
vez que tive vontade de bater em alguém que dava em cima do Leonardo. Será que
isso era ciúme? Caramba! Se ele estivesse razão, eu estava perdido.
Por volta dás quatro da manhã deixamos a balada e seguimos para sua casa. Ao
chegarmos, fomos direto tomar banho. Começamos a nos amar ali mesmo, em meio a
espuma do xampu. Que loucura! A mão que deslizava pelo meu corpo sem pelos,
enquanto nossas bocas, unidas, pouco nos permitia respirar. Cada dia que
passava inventávamos algo novo.
O que começamos no
chuveiro, continuamos na cama. Sua pele tocando à minha, estava causando-me
arrepio. Cada dia que passava, o Leonardo estava cada vez mais gostoso,
carinhoso, atencioso.
Após fazermos amor, nos abraçamos e depois de dar-lhe um beijo na testa, disse
sem querer:
-Te amo!
Sorrindo, ele mal
acreditou:
-O quê? - Perguntou olhando-me
profundamente nos olhos.
-Desculpa.
-Não...
Repete?
-Pra quê?
-É a
primeira vez que você diz que me ama...
-Eu
disse?
-Você
acabou de dizer.
Naquele momento eu fui
me dar conta de que o Leonardo não estava mais carinhoso do que já era, nem
mais gostoso. Era eu que estava apaixonado. A Talita tinha razão, assim como o
Emerson. O que não deveria acontecer, aconteceu. Droga! Como eu poderia me
apaixonar por um cara cujo estava tentando destruir sua vida?
Minha cabeça estava confusa, mas de qualquer forma, eu queria aproveitar aquela
sensação da qual eu jamais havia provado antes, e estava gostando.
Enquanto dormíamos, abraçados, sua carteira estava ao meu alcance. Cheguei a levantar-me
para pegá-la, mas na hora não tive coragem. Pra que fazer aquilo? O dinheiro
era do cara, e se trabalhou para conseguir, ninguém tinha o direito de roubar,
e se eu passasse aqueles dados pra Talita, eu seria um ladrão, mau caráter,
tanto quanto ela.
Por mais que eu
tentasse não pensar, um peso na alma tirava-me a paz. Toda vez que o Leonardo
me tocava, beijava, e eu correspondia, não estava sendo verdadeiro. Olhar em
seus olhos eu já não conseguia mais, pois o sentimento que se abrigou dentro de
mim transformou-me por completo numa pessoa totalmente diferente do que eu era,
pra melhor, claro.
Próximo capítulo: |
Descobri que te amo |
Dia 24/03
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