Cheguei em casa um pouco
antes das nove e meia da manhã. Sem fazer barulho, subi a escada até meu
quarto. Por mais que eu tivesse dormido maravilhosamente bem na companhia do
meu amor, ainda tinha sono, e uma vontade louca de me jogar na cama outra vez.
Joguei-me sobre ela e comecei a tirar o tênis, mas antes
que voltasse a pegar no sono novamente, minha mãe bateu à porta:
-Tom?
-Oi mãe!
-Chegou agora?
-Sim.
-Já estou quase pronta, só
estava te esperando.
-Para quê?
-Esqueceu que hoje iremos
almoçar na casa da sua tia Sandra?
-É mesmo!
Levantando-me da cama, falei:
-Eu vou trocar de roupa e
já desço.
-Está bem. Enquanto isso
eu vou passar a chapinha no cabelo.
-Mas o seu cabelo está
ótimo...
-Ficará melhor depois da
chapinha.
-Depois você faz em mim?
-Desse jeito não iremos
sair nunca de casa.
-Está bem, eu vou colocar
um boné então.
-Não demore.
-Tá.
Troquei de roupa, coloquei um boné e fui esperar pela
minha mãe no carro. Enquanto colocava um CD do Fresno para ouvir, meu celular
começou a tocar.
-Alô?
-Oi Tom!
-Oi, Kico.
-Eu preciso de um favor
seu.
-Que favor?
-Você pode me dar o
telefone da Soraia?
-Nossa! Como assim? Vocês
não trocaram telefone ontem?
-E você acha que a gente
ia perder tempo com isso?
-Espere que eu vou pegar.
-Tá.
Do Kico eu poderia esperar tudo, pois desligado do jeito
que ele era, não me surpreenderia que alguns detalhes fossem esquecidos.
-Nossa... Sua amiga é
demais!
-Eu sei...
-Mas eu tô falando em
outro sentido.
-Ué... Vocês já...
-Ainda não, mas o beijo
daquela mina é bom demais, mano... Imagine o resto...
-Bem, isso você descobrirá
sozinho.
-Sozinho não, com ela.
-É verdade. Bom domingo
pra você e boa sorte.
-Pra você também.
Após fechar a porta de casa, minha mãe entrou no carro
dizendo:
-Pronto! Não ficou do
jeito que eu queria, mas tá bom... Afinal, não vamos para nenhum casamento.
Durante o caminho pouco nos falamos, pois a tia Sandra
não morava tão longe de casa, além de eu ter cochilado um pouco. Assim que
chegarmos, logo fomos recebidos pela minha avó, surpreendendo-me em saber que
também estava lá. Até então eu pensava que só estariam a tia Sandra e o tio
Marcelo.
Desci do carro e ela já foi logo me abraçando:
-Rustom!
-Oi, vó!
-Como você tá bonito...
-Ué... Estou igual quando
a senhora me viu da última vez... Nem faz tanto tempo assim.
-Claro que faz... Foi no
Natal...
Enquanto minha mãe e a vovó se cumprimentavam, cruzei o
portão e logo senti o cheiro de churrasco. Eu nunca gostei dessas reuniões de
família, pois eram muito chatas, onde todo mundo se encontra para ficarem se
elogiando como se não se vissem há anos, e o pior de tudo, adoravam apertar
minhas bochechas, isso me irritava.
Segurando uma bandeja a tia Sandra apareceu no quintal.
-Rustom!
-Oi tia!
-Como você está lindo!
-Pare com isso...
-Não está com calor com
essa roupa preta?
-Já estou acostumado...
Sentei-me em uma das cadeiras que havia próximas ao muro,
embaixo da sombra fresca que também abrigava a churrasqueira.
Abraçada à vovó, minha mãe chegou dizendo:
-Nossa! Eu não sabia que
iria ter até churrasco...
Segurando um copo de cerveja na mão o tio Marcelo
apareceu, e apoiando-se ao batente da porta falou:
-E você acha que a ocasião
não merece?
-Claro!
-Cadê o Renatão?
Ele foi muito infeliz ao fazer aquela pergunta, e quando
eu pensei que deixaria minha mãe em uma situação embaraçosa, ela tirou de
letra.
-Nós estamos nos
separando.
Puxando uma cadeira a tia Sandra falou:
-Ah... Mas já estava mais
que na hora. Até que você demorou pra acordar...
Para que o assunto não tivesse proporções maiores, minha
mãe mudou logo de assunto:
-Vocês só convidaram nós
para esse churrasco?
Após dar um gole em um copo de refrigerante minha tia
respondeu:
-Foi de última hora... A
gente vai fazer um outro em breve e chamar todo mundo, né mô?
-Uhum.
Tudo corria bem, até que o tio Marcelo, com suas
inconveniências, perdeu a oportunidade de ficar calado:
-E as namoradas, Tom?
-Que namoradas?
-Não tem catado umas
menininhas?
-Sou um homem de uma
pessoa só.
-Corta essa... Todo homem
nunca deixa de “caçar”.
-Não fale por você, tio.
Silêncio. Por que será que em toda família sempre tem
alguém para fazer esse tipo de pergunta? Se for por falta de assunto, acho que
a melhor coisa é se calar, pois eu já não tolerava perguntas invasivas como
aquela, e as respostas seriam as piores possíveis, à altura.
Tirando aquele estúpido episódio, até que passamos um
domingo agradável, em família, ou parte dela.
Cheguei em casa morto de cansado, e depois de tomar um
banho, caí na cama e não vi mais nada, apaguei.
No outro dia cheguei um pouco atrasado para à aula.
Reparei que as coisas do Cauê estavam sobre sua carteira, porém, ele não
estava. Enquanto o professor explicava sobre um determinado trabalho para
fechamento do semestre, a Soraia sussurrou:
-Tom... Seu amigo é
demais...
-O que vocês aprontaram?
-Nada...
-Sei. Ficou em casa ontem?
-Não, fui ao cinema com o
Kico.
-Ah é?
-Ai Tom... Seu amigo é tão
carinhoso, romântico... Acho que estou apaixonada.
-Que bom para você.
-Estou vivendo um sonho...
Mordendo a ponta do lápis, perguntei:
-Soraia... Onde está o
Cauê?
-Não sei. Ele saiu, mas
não disse para onde iria.
Colocando a mão dentro de uma urna o professor disse:
-Pessoal, agora eu vou
sortear os integrantes para formarem os grupos. Grupo número um... Dênis...
Cauê... Cristina... Isabel e... Tânia.
Nesse momento o Cauê entrou à sala, e após sentar-se em
sua cadeira, perguntou:
-O professor já sorteou os
grupos?
Sussurrando, a Soraia respondeu:
-Ele começou agora, e você
está no grupo número um.
-Eu e mais quem?
Interrompendo o assunto, respondi:
-Gente, deixe isso para depois.
O professor está esperando silêncio...
Apoiando-se à mesa o professor perguntou:
-Posso continuar?
Todos:
-Pode.
-Vamos lá... Grupo número
dois... Leandro... Rustom... Jéssica... Bianca e... Soraia.
Era só o que faltava, eu e a Jéssica no mesmo grupo. Por
mais que a gente nos cumprimentava, era óbvio que um não gostava do outro, por
diversos motivos. Parecia uma praga, e o pior de tudo era que o trabalho não
poderia deixar de ser feito, pois daquela disciplina não havia prova, somente o
trabalho, e se eu deixasse de fazer consequentemente ficaria em DP.
Após o término da aula, procurei o professor antes que
ele deixasse a sala e disse:
-Professor... Eu gostaria
de te pedir um favor...
-Diga, Rustom?
-Eu quero pedir para mudar
de grupo.
-Por qual motivo?
-Bem... Eu não me dou bem
com uma integrante do grupo e prefiro...
-Sinto muito, mas as
diferenças pessoais de vocês não devem interferir no lado profissional. Ambos
terão que aprender a conviver juntos sem se gostar...
-Mas professor...
-Rustom, ninguém entra no
meio jurídico para fazer amizades. Todos possuem objetivos e interesses
profissionais, sendo assim, comece a ter maturidade.
Sem mais nada a dizer ele pegou suas coisas e deixou à
sala.
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