sexta-feira, 29 de julho de 2016

O QUE OLHOS NÃO VEEM - CAPITULO 12




Na segunda feira acordei ansioso, não vendo a hora de apresentar logo aquele trabalho e finalmente fechar aquele semestre. Depois de tomar café, peguei carona com minha mãe para ir à faculdade.
            Sempre quando eu ia com ela chegava mais cedo, e naquele dia não foi diferente. Por ser a última semana de aula, os alunos estavam afoitos, louco pelas férias de meio de ano, e eu, claro, não via a hora de poder viajar com o meu amorzinho.
            Ao entrar no elevador cruzei com a Bianca, que ao me ver exclamou:
-Bom dia, Rustom!
-Oi florzinha!
-Tempo maluco esse, né?
-É... Mas hoje está gostosinho...
-Finalmente!
            Ao sairmos do elevador, a Jéssica e a Amanda estavam paradas à porta no hall. Coloquei meu fone de ouvido para não ouvir qualquer provocação que elas viessem a fazer e passei direto, seguindo para a sala de aula.
            Sentei-me à carteira e fiquei aguardando o professor chegar, para assim começarem as apresentações dos trabalhos. Eu nem reparei em quem já estava na sala, e ao ver-me sentar-se mais à frente a Soraia mudou-se para uma carteira próxima à minha.
-Nossa!... Nem falou comigo...
                        Tirando o fone do ouvido, falei:
-Desculpa, o que você disse?
-Eu disse que você chegou e nem falou comigo...
-Ah... Eu estava distraído, nem vi quem estava na sala. Não foi por mal, miguxa.
-Tudo bem.
            Os alunos começaram a entrar na sala e tomarem seus lugares, e no meio do tumulto estava o professor, zoando com a galera. Aquele professor não regulava muito bem das ideias, parecia um adolescente. Certa vez eu o vi sentado na sala dos professores, sozinho, olhando para o teto sem se mover, permanecendo naquela posição por longo tempo.
            Antes das apresentações começarem o Cauê entrou na sala, guiado pelo Emílio, que finalmente recebeu autorização permanente para entrar nas dependências da universidade, quase que um semestre inteiro enfrentando a burocracia.
-Bom dia, Tom!
-Bom dia, mozinhu.
-A aula já começou?
-Ainda não...
            Abrindo seu fichário a Soraia comentou:
-Ai... Não aguento mais ouvir falar de Platão, Ética, Moral...
-Soraia! Nem percebi que você estava ai...
-Oi Cauê! Estou sim...
-Não senti a fragrância do seu creme de baunilha...
-É que hoje passei outro...
-Ah! Por isso.
            Quando as apresentações iniciaram, deixei meu MP5 gravar o áudio para estudar depois, porque é sempre bom guardar matéria e informação para aperfeiçoar nossos estudos. Seríamos o quinto grupo a se apresentar, e aquela aula parecia uma eternidade, pois as horas não passavam e o calor em sala estava incomodando, mesmo estando ligados todos os ventiladores de parede.
            Enquanto o segundo grupo explicava o conteúdo de sua pesquisa, a Soraia levantou-se e deixou a sala, provavelmente para ir ao banheiro.
            Com o rosto virado de lado o Cauê falou sussurrando:
-Depois você faz uma cópia da explicação para mim, mô?  
            No mesmo tom, respondi:
-Tá bom.
            Às vezes o áudio não ficava muito bom para entendimento, isso acontecia quando o professor percorria a sala inteira ou quando todo mundo resolvia falar ao mesmo tempo. No decorrer da aula, percebi uns cochichos e risadinhas vindas da turma do fundo. Algo de perverso eles estavam tramando e não demoraria muito para perceber o tamanho da maldade.
            Quando a Soraia voltou à sala, o silêncio se fez presente enquanto fechava à porta. No momento em que ela sentou-se à cadeira, todo mundo levantou-se, como se simulassem um forte impacto, seguida de uma gargalhada coletiva.
            A Soraia ficou arrasada. Também, pudera, o que aquelas pessoas estavam fazendo era uma tortura psicológica, a pior que existe. Naquele momento eu tive vontade de bater em todo mundo, com ódio daquelas pessoas malditas que se achavam perfeitas.
            Chorando, ela saiu da sala, e eu, indignado com o que fui obrigado a presenciar, corri atrás dela. Pessoas como aquelas não tinham coração. O que eu não entendia era como pessoas daquela índole poderiam defender alguém em um tribal, cobrar justiça se elas eram os primeiros a burlar, julgar, irem contra os princípios éticos da classe. Várias vezes eu os ouvi comentando sobre o que praticavam no dia a dia, como o suborno a policiais, brigas envolvendo agressões em transito. Será essa a nova geração de profissionais da classe média alta que terá o país?
            Encontrei a Soraia sentada ao degrau da escada, chorando, com suas mãos tapando seu rosto coberto de vergonha.
            Sentando-me ao seu lado, dei-lhe um abraço e disse:
-Sô... Não fique assim...
-Não é fácil... Passar por isso...
-Eu sei que não é, sou vítima de preconceito o tempo inteiro... Mas se eu mostrar que sou fraco e que isso me abala eles estarão se achando vencedores.
-Só Deus sabe o quanto eu sofro por ser assim...
-Tudo na vida tem um motivo, e nada acontece por acaso. Use essa experiência dolorosa para que seu futuro tenha valor pelas dificuldades que você passou.
            Limpando suas lágrimas ela disse:
-Sabe que... Você é o primeiro Emo que eu vejo que não apanha da vida calado, não chora fácil e nem se corta quando está triste.
-Não é só porque sou Emo que devo fazer tudo que a maioria deles fazem. Eu me sinto bem ouvindo as músicas, usando as roupas, a balada, mas não preciso aderir a uma personalidade coletiva... Eu tenho a minha...
-Quando eu ia pra balada, ninguém olhava pra mim... Só porque sou gorda.
-Você é linda!... Agora tem o Kico que te quis do jeito que você é...
-Sim... Ele é o melhor namorado do mundo!
-Sabe que o Cauê me ensinou muitas coisas, e uma delas é ver o mundo com os olhos do coração. Você, Soraia, é a melhor amiga que alguém pode ter, e se eles não te têm é porque não merecem.
-Estou sem palavras, Tom...
-Não precisa dizer nada.
-Escreve o que eu tô dizendo... Eu ainda serei uma Miss...
-Com certeza!
            Demos um abraço gostoso, em seguida falei:
-Agora erga essa cabeça e mostre a todos que você é muito mais do que eles imaginam.
-Pode deixar.
-Vamos pra sala, porque ainda temos que apresentar nosso trabalho, e eu quero ver você arrasando...
-Tudo bem.
            Ao voltarmos para a sala de aula, nosso grupo já estava se preparando para iniciar a apresentação. Após um profundo suspiro a Soraia começou, dando um show de inteligência e força, mostrando a todos que piada alguma abalaria sua vida, nunca mais. Confesso que todos nos saímos muito bem, e pela cara do professor, nossa nota não seria inferior a oito.
            Na hora do intervalo combinamos de descer para comer algo, pois todos os três já haviam se apresentado. Enquanto ajudava o Cauê a se levantar, notei que a Bianca aproximava-se de nós:
-Soraia... Será que eu poderia falar com você?
-Por favor, seja breve.
-Eu quero pedir desculpa por ter participado dessa brincadeira...
-De mau gosto, por sinal.
-Eu não sabia que te faria tão mal...
-Tudo bem... Vamos esquecer as mágoas.
-Obrigada!
            Assim que a Bianca deixou à sala a Soraia comentou:
-Nem sei por que a desculpei.
-Você deixou o coração falar?
-Pois é... Sou boa demais.
-Está explicado... Você fez a coisa certa.
-Fiz?
-Claro... Somente os nobres são capazes de desculpar. Se seu coração sentiu que ela estava sendo sincera, não tinha motivos para que não fizesse.
-É...
            Caminhávamos em direção à porta quando dois rapazes apareceram, e um deles perguntou à Soraia em voz alta:
-O Leandro veio hoje?
-Veio...
-Valeu.
            Nesse momento o Cauê apertou-me o braço com força, demonstrando certo temor. Preocupado perguntei:
-Está tudo bem, mozinho?
            Trêmulo ele respondeu:
-Essa voz...
-O que tem?
-Foi ele, Tom.
-O que ele fez?
-Ele foi um dos que me jogou na piscina no primeiro dia de aula...
-Você tem certeza?
-Tenho... Eu jamais esqueceria essa voz.
-Preciso descobrir de que sala ele é... Se ao menos eu soubesse seu nome...
            Apertando o botão do elevador a Soraia falou:
-Ele é o Cristiano, amigo do irmão do Leandro...
-Ah!... Aquele que eles estavam comentando na casa da Jéssica...
-É...
-Vamos até a coordenação agora.
            Tirando seus óculos, a Soraia questionou:
-Fazer o quê?
-Agora nós temos como prestar queixa contra os criminosos que quase mataram o amor da minha vida, pois sabemos quem foi.
-Mas o Cauê só reconheceu um.
-Não importa... Ele não vai querer pagar sozinho e vai dizer o nome dos comparsas...
            Amedrontado, o Cauê não largava meu braço. As portas do elevador se fecharam, e com a voz embargada o Cauê falou:
-Tom... Por favor, não deixe que me machuquem...
-Ninguém vai te machucar... Estou aqui para te defender e proteger de tudo e de todos. Você confia em mim?
-Confio.
            Ao chegarmos à coordenação, pedi para falar com a Gabriela, responsável pelo curso de Direito naquele dia. Pouco tempo depois ela recebeu-me em sua sala. Claro que fui bem recebido, porque eles já sabiam do que eu era capaz, não medindo esforços para defender o que era meu.


quinta-feira, 28 de julho de 2016

O QUE OLHOS NÃO VEEM - CAPITULO 11





Alguns dias se passaram. Naquela manhã de sábado, levantei cedo antes que minha mãe saísse para trabalhar, pois precisava pegar um dinheiro com ela para fazer o trabalho de direito. Confesso que não me sentia nem um pouco confortável com a ideia de ter que ir fazer o trabalho na casa da Jéssica, mas já que todo mundo concordou, não tive como não ir.
            Peguei carona com a mãe da Soraia, que se ofereceu para nos levar, pois era caminho de seu trabalho. Marcamos de nos encontrar às 13 horas em frente ao parque Trianon-Masp, na Avenida Paulista.
            Cheguei lá pontualmente, e minutos depois, ouvi a buzina do carro.
-Boa dia!
-Bom dia, Tom!
            Fechando à porta traseira perguntei:
-Você recebeu meu e-mail ontem à noite, Soraia?
-Recebi sim... Eu trouxe o notebook, está na mochila ai atrás.
-Que bom!
-Sabe que eu não estou muito a fim de ir até a casa da Jéssica...
-Eu também não.
            Pegando à Avenida 23 de maio sua mãe perguntou:
-Por quê?
-Porque a maioria das pessoas que estarão lá, são do mal.
-Do mal?
-É... Vivem praticando maldade...
-Que tipo de maldade?
-Eles vivem aprontando na faculdade, brigam na balada, e são super preconceituosos.
-Que horror! São todos da sala?
-Todos não, poucos, mas contaminam todo o resto... Você sabe como moleques são...
            Tirando a franja do olho, completei:
-E o pior é que as meninas também se deixam influenciar.
-Soraia, eu não quero que você se misture com esse tipo de gente.
-Mas não estou no grupo deles porque eu quero, o professor fez um maldito sorteio e infelizmente eu e o Tom fomos “premiados”.
            Parando o carro em uma travessa da Avenida Ibirapuera, a mãe da Soraia falou:
-Bem... Aqui está bom pra vocês?
-Sim.
-Bom estudo, crianças!
-Obrigado!
            Descemos do carro e seguimos caminhando e conversando pela rua da igreja até o condomínio onde a Jéssica morava:
-Tom... Estive pensando...
-O quê?
-Se a Jéssica está no meio daquele pessoal que pratica maldade, a gente bem que poderia usar isso para descobrir quem tentou afogar o Cauê no trote...
-Mas será que ela ficou sabendo?
-É quase certo que sim...
-E como faremos então para conseguir?
-Ainda não sei... Mas vou pensar em uma maneira.
-Está bem...
            Tocamos o interfone e aguardamos o porteiro liberar nossa entrada. Enquanto isso, observávamos os empregados do condomínio lavar a escada da portaria. Eu já estava quase desistindo e voltando para minha casa quando chegou à permissão para que subíssemos.
            Ao entrarmos no elevador, comentei com a Soraia:
-Espero que não demore muito esse trabalho.
-Pois é... Eu só vim porque não terá substitutiva no final do semestre.
-Você lembra qual é o andar?
-Acho que é o oitavo.
-Certo.
            Os apartamentos eram um por andar. Já no oitavo tocamos a campainha e fomos recebidos pela Bianca, melhor amiga da Jéssica:
-Olá!
-Oi...
-Chegaram cedo...
            Suspirando, respondi:
-É porque queremos ir embora cedo.
-Então tá... A Jéssica está no banho...
            Apontando para o sofá ela falou:
-Sentem-se... Ela já deve estar saindo.
            Colocando sua mochila sobre o colo a Soraia sussurrou:
-Pelo menos a Bianca é mais simpática.
-Embora tenho tido pouco contato, não tenho nada contra ela.
            Puxando a cadeira, a Bianca sentou-se à mesa da sala dizendo:
-Gente... Eu trouxe a constituição...
-Ai eu ia trazer, mas acabei esquecendo...
-Não tem problema, Soraia... Se precisar pode usar a que eu trouxe... Vocês já querem começar?
            Olhei para a Soraia e levantamos, sentando-nos à mesa para darmos início ao trabalho e assim podermos ir embora mais cedo. Tirando o estojo da mochila, falei:
-Estive pesquisando na internet sobre Direito Penal e encontrei muita coisa.
-Você trouxe?
-Gravei no meu MP5...
            Estendendo à mão a Soraia disse:
-Dá ele aqui pra eu ver no meu notebook.
-Toma.
            Pegando meu estojo em sua mão a Bianca falou:
-Ai que gracinha esse cachorrinho!
-Tenho vários... Mas não dá pra colocar todos no estojo...
-Eu amei! Onde vende?
-Ah... Não adianta, minha tia me deu, pois ela comprou de uma artesã bem velhinha lá em Minas...
-Ah que pena!
-Mas já que você gostou tanto, pode ficar com ele.
-Imagina... Ele é seu...
-Pode pegar, tenho vários.
-Jura? Obrigada!
            Presos ao zíper do meu estojo havia vários pequenos cachorrinhos de madeira, dados pela tia Sandra que comprou quando foi passar suas férias na casa de sua sogra em Belo Horizonte.
            Virando a tela do computador para nós a Soraia falou:
-Gente... Está aqui...
            Folheando o Código Penal, perguntei:
-Sobre o que vamos ter que falar mesmo?
-Crime contra a vida.
            Nesse momento a Jéssica apareceu na sala, com o cabelo molhado e banhada em perfume, chegando a dar dor de cabeça.
            Puxando à cadeira ao lado da Bianca ela falou:
-Desculpem a demora...
-Olha o que eu ganhei, Ka?
-O que é isso?
-Um cachorrinho... Não é uma gracinha?
-Tira esse negócio horroroso de perto de mim.
-Credo, Ka!
            A campainha tocou. Demonstrando total repugnância quanto ao cachorrinho, a Jéssica levantou-se da cadeira e dirigiu-se à porta. Já era de se esperar que alguma reação pejorativa aquela garota teria, pois seu jeito esnobe e arrogante de ser não permitiria outra atitude que não fosse preconceituosa.
            O clima ficou pior ainda com a chegada do Leandro. Não que eu tivesse algo contra ele, pois mal nos falávamos, mas fazendo parte do grupinho da Jéssica já me deixava desconfiado. Ao sentarem-se à mesa, demos início ao trabalho. Enquanto selecionávamos o que iriamos incluir no editor de texto, a Soraia já o digitava em metodologia acadêmica.
            Levantando-se da cadeira a Bianca falou:
-Vou até a cozinha beber água. Alguém quer?
            Juntando umas folhas de seu fichário o Leandro respondeu:
-Eu quero.
            Enquanto ela foi buscar, entreguei o Código Penal para a Jéssica dizendo:
-Dá uma olhada nisso...
-Como você encontrou?
-Procurando.
            Achando que eu havia debochado, o Leandro começou a rir e disse:
-Hahaha... Bem feito...
-Cala a boca, Leandro... Obrigada, Rustom...
-Desculpa, eu não falei por mal...
-Olha aqui, Rustom... É com grande desprazer e sacrifício que estou lhe recebendo em minha casa...
-Não se preocupe, a recíproca é verdadeira.
-Não pense que esqueci que por sua causa eu fiquei dois dias suspensa na faculdade...
            Nesse momento a Bianca voltou à sala, colocou um copo com água sobre a mesa e disse:
-Gente... Quando é que teremos aula sobre Medicina Legal?          
            Pegando o copo da mesa o Leandro falou:
-Não faço ideia.
            Tirando uma folha de seu fichário a Jéssica disse:
-Por falar em medicina... Minha prima está cursando e disse que na aula de laboratório eles mexem em corpos de verdade...
            Rindo, o Leandro questionou:
-Você achou que fosse o quê? Bonecos?
-Ai... Sei lá...
            Colocando seus óculos a Soraia entrou na conversa:
-Minha mãe uma vez me contou que são corpos de mendigos e indigentes.
-Que horror!
            Completei:
-Mas também tem aqueles que a família doa para estudo.
-Sim, mas são raros.
            Dirigindo-se até a varanda da sala a Jéssica disse:
-Deus me livre ter que colocar a mão em um mendigo... Arriscando a pegar uma doença...
            Ajeitando-se à cadeira a Bianca falou:
-Mas os corpos ficam banhados em formol, não tem mais como transmitirem doenças...
-Você que pensa, minha filha... Essa gente já nasce contaminada...
            Abismada, a Soraia exclamou:
-Que horror!
-A Jéssica tem razão... Tem que exterminar essa raça... Está certo o meu irmão...
            Curiosa, a Bianca perguntou:
-O que tem seu irmão?
-Vixi!... Ele odeia... Já pôs fogo em um monte...
            Levando a mão ao peito a Soraia questionou:
-Seu irmão põe fogo em mendigo?
-Meu irmão é foda... E quando ele bate nas puta? Nossa... Chega a dar dó...
            Cruzando os braços a Bianca demonstrou sua indignação, questionando:
-E você já participou disso?
-Lógico...
-E ainda fala como se fosse um esporte saudável...
-Depois te mostro as fotos e os vídeos do mendigo pegando fogo e gritando...
-Eu não quero ver nada, seu nojento.
            Aproximando-se à mesa a Jéssica disse:
-É aquele que você me mandou?
-Sim...
-Você também está nessa, Ka?
-Eu não, mas ele me mandou e eu vi... É de dar dó mesmo.
-Ei... O Cristiano foi...
-Que Cristiano?
-O do terceiro ano.
-Você já conhecia ele antes de entrar na faculdade, Leandro?
-Ele é amigo do meu irmão...
            Rindo, a Jéssica falou:
-São tudo da mesma laia...
            Jogando-lhe uma bolinha de papel o Leandro falou:
-O que você tá falando ai?... Até parece que você fica atrás... Jogando ovo em pedestre.
            Pronto, começaram a falar dos podres um do outro, enquanto eu e a Soraia assistíamos a tudo, chocados.
-Que história é essa de ovo, Ka?
-É que minha prima mora em um apartamento de frente para o mar em Copacabana, e ela tem o costume de brincar com as amigas do prédio jogando ovo nos turistas que caminham no calçadão...
-E você acha isso engraçado?
-Muito. Quando vou pro Rio, passamos boa parte da madrugada brincando de acertar os carros que passam pela avenida...
-E sua tia, não fala nada?
-Que nada, às vezes ela até se junta a nós...
            Após um suspiro, a Soraia perguntou:
-E ninguém vê vocês fazendo isso?
-Claro que não... A gente se esconde muito bem. Além do mais, a polícia não irá perturbar um prédio de luxo como aquele.
            Fiquei perplexo com tudo que ouvi. Eu já sabia que a Jéssica não valia nada, mas confesso que fiquei surpreso com a confissão de suas barbaridades, e o que era pior, agia como se aquele tipo de atividade fizesse bem para ela, assim como o Leandro também.
            Terminamos o trabalho já passava das quatro da tarde. Eu não via a hora de sair daquela casa, pois não aguentava mais ter que suportar a Jéssica e suas futilidades. Ao cruzarmos o portão do condomínio, a Soraia exclamou:
-Graças a Deus!
-Nunca mais quero voltar a esse lugar.
-Nem eu.
-Ainda bem que a estação de metrô não está muito longe daqui.
-Metrô?
-É.
-Ah não... Vamos de táxi...
-Nem tenho grana pra pegar táxi.
-Sem problemas, eu pago.
-Nada disso, miguxa... Mas se você quiser ir de táxi não tem problema...
-Eu vim com você e voltarei com você. Vamos pegar o metrô.
-Oba!

            Acredito que nada na vida acontece por acaso, e ter ido parar na casa daquela enjoada teria mais um motivo por ajuda do destino, dando o primeiro passo para identificar quem eram os delinquentes que tentaram afogar o Cauê.

quarta-feira, 27 de julho de 2016

O QUE OLHOS NÃO VEEM - CAPITULO 10




      Cheguei em casa um pouco antes das nove e meia da manhã. Sem fazer barulho, subi a escada até meu quarto. Por mais que eu tivesse dormido maravilhosamente bem na companhia do meu amor, ainda tinha sono, e uma vontade louca de me jogar na cama outra vez.
            Joguei-me sobre ela e comecei a tirar o tênis, mas antes que voltasse a pegar no sono novamente, minha mãe bateu à porta:
-Tom?
-Oi mãe!
-Chegou agora?
-Sim.
-Já estou quase pronta, só estava te esperando.
-Para quê?
-Esqueceu que hoje iremos almoçar na casa da sua tia Sandra?
-É mesmo!
            Levantando-me da cama, falei:
-Eu vou trocar de roupa e já desço.
-Está bem. Enquanto isso eu vou passar a chapinha no cabelo.
-Mas o seu cabelo está ótimo...
-Ficará melhor depois da chapinha.
-Depois você faz em mim?
-Desse jeito não iremos sair nunca de casa.
-Está bem, eu vou colocar um boné então.
-Não demore.
-Tá.
            Troquei de roupa, coloquei um boné e fui esperar pela minha mãe no carro. Enquanto colocava um CD do Fresno para ouvir, meu celular começou a tocar.
-Alô?
-Oi Tom!
-Oi, Kico.
-Eu preciso de um favor seu.
-Que favor?
-Você pode me dar o telefone da Soraia?
-Nossa! Como assim? Vocês não trocaram telefone ontem?
-E você acha que a gente ia perder tempo com isso?
-Espere que eu vou pegar.
-Tá.
            Do Kico eu poderia esperar tudo, pois desligado do jeito que ele era, não me surpreenderia que alguns detalhes fossem esquecidos.
-Nossa... Sua amiga é demais!
-Eu sei...
-Mas eu tô falando em outro sentido.
-Ué... Vocês já...
-Ainda não, mas o beijo daquela mina é bom demais, mano... Imagine o resto...
-Bem, isso você descobrirá sozinho.
-Sozinho não, com ela.
-É verdade. Bom domingo pra você e boa sorte.
-Pra você também.
            Após fechar a porta de casa, minha mãe entrou no carro dizendo:
-Pronto! Não ficou do jeito que eu queria, mas tá bom... Afinal, não vamos para nenhum casamento.
            Durante o caminho pouco nos falamos, pois a tia Sandra não morava tão longe de casa, além de eu ter cochilado um pouco. Assim que chegarmos, logo fomos recebidos pela minha avó, surpreendendo-me em saber que também estava lá. Até então eu pensava que só estariam a tia Sandra e o tio Marcelo.
            Desci do carro e ela já foi logo me abraçando:
-Rustom!
-Oi, vó!
-Como você tá bonito...
-Ué... Estou igual quando a senhora me viu da última vez... Nem faz tanto tempo assim.
-Claro que faz... Foi no Natal...
            Enquanto minha mãe e a vovó se cumprimentavam, cruzei o portão e logo senti o cheiro de churrasco. Eu nunca gostei dessas reuniões de família, pois eram muito chatas, onde todo mundo se encontra para ficarem se elogiando como se não se vissem há anos, e o pior de tudo, adoravam apertar minhas bochechas, isso me irritava.
            Segurando uma bandeja a tia Sandra apareceu no quintal.
-Rustom!
-Oi tia!
-Como você está lindo!
-Pare com isso...
-Não está com calor com essa roupa preta?
-Já estou acostumado...
            Sentei-me em uma das cadeiras que havia próximas ao muro, embaixo da sombra fresca que também abrigava a churrasqueira.
            Abraçada à vovó, minha mãe chegou dizendo:
-Nossa! Eu não sabia que iria ter até churrasco...
            Segurando um copo de cerveja na mão o tio Marcelo apareceu, e apoiando-se ao batente da porta falou:
-E você acha que a ocasião não merece?
-Claro!
-Cadê o Renatão?
            Ele foi muito infeliz ao fazer aquela pergunta, e quando eu pensei que deixaria minha mãe em uma situação embaraçosa, ela tirou de letra.
-Nós estamos nos separando.
            Puxando uma cadeira a tia Sandra falou:
-Ah... Mas já estava mais que na hora. Até que você demorou pra acordar...
            Para que o assunto não tivesse proporções maiores, minha mãe mudou logo de assunto:
-Vocês só convidaram nós para esse churrasco?
            Após dar um gole em um copo de refrigerante minha tia respondeu:
-Foi de última hora... A gente vai fazer um outro em breve e chamar todo mundo, né mô?
-Uhum.
            Tudo corria bem, até que o tio Marcelo, com suas inconveniências, perdeu a oportunidade de ficar calado:
-E as namoradas, Tom?
-Que namoradas?
-Não tem catado umas menininhas?
-Sou um homem de uma pessoa só.
-Corta essa... Todo homem nunca deixa de “caçar”.
-Não fale por você, tio.
            Silêncio. Por que será que em toda família sempre tem alguém para fazer esse tipo de pergunta? Se for por falta de assunto, acho que a melhor coisa é se calar, pois eu já não tolerava perguntas invasivas como aquela, e as respostas seriam as piores possíveis, à altura.
            Tirando aquele estúpido episódio, até que passamos um domingo agradável, em família, ou parte dela.
            Cheguei em casa morto de cansado, e depois de tomar um banho, caí na cama e não vi mais nada, apaguei.
            No outro dia cheguei um pouco atrasado para à aula. Reparei que as coisas do Cauê estavam sobre sua carteira, porém, ele não estava. Enquanto o professor explicava sobre um determinado trabalho para fechamento do semestre, a Soraia sussurrou:
-Tom... Seu amigo é demais...
-O que vocês aprontaram?
-Nada...
-Sei. Ficou em casa ontem?
-Não, fui ao cinema com o Kico.
-Ah é?
-Ai Tom... Seu amigo é tão carinhoso, romântico... Acho que estou apaixonada.
-Que bom para você.
-Estou vivendo um sonho...
            Mordendo a ponta do lápis, perguntei:
-Soraia... Onde está o Cauê?
-Não sei. Ele saiu, mas não disse para onde iria.
            Colocando a mão dentro de uma urna o professor disse:
-Pessoal, agora eu vou sortear os integrantes para formarem os grupos. Grupo número um... Dênis... Cauê... Cristina... Isabel e... Tânia.
            Nesse momento o Cauê entrou à sala, e após sentar-se em sua cadeira, perguntou:
-O professor já sorteou os grupos?
            Sussurrando, a Soraia respondeu:
-Ele começou agora, e você está no grupo número um.
-Eu e mais quem?
            Interrompendo o assunto, respondi:
-Gente, deixe isso para depois. O professor está esperando silêncio...
            Apoiando-se à mesa o professor perguntou:
-Posso continuar?
            Todos:
-Pode.
-Vamos lá... Grupo número dois... Leandro... Rustom... Jéssica... Bianca e... Soraia.
            Era só o que faltava, eu e a Jéssica no mesmo grupo. Por mais que a gente nos cumprimentava, era óbvio que um não gostava do outro, por diversos motivos. Parecia uma praga, e o pior de tudo era que o trabalho não poderia deixar de ser feito, pois daquela disciplina não havia prova, somente o trabalho, e se eu deixasse de fazer consequentemente ficaria em DP.      
            Após o término da aula, procurei o professor antes que ele deixasse a sala e disse:
-Professor... Eu gostaria de te pedir um favor...
-Diga, Rustom?
-Eu quero pedir para mudar de grupo.
-Por qual motivo?
-Bem... Eu não me dou bem com uma integrante do grupo e prefiro...
-Sinto muito, mas as diferenças pessoais de vocês não devem interferir no lado profissional. Ambos terão que aprender a conviver juntos sem se gostar...
-Mas professor...
-Rustom, ninguém entra no meio jurídico para fazer amizades. Todos possuem objetivos e interesses profissionais, sendo assim, comece a ter maturidade.
            Sem mais nada a dizer ele pegou suas coisas e deixou à sala.


terça-feira, 26 de julho de 2016

O QUE OLHOS NÃO VEEM - CAPITULO 9



Ao chegarmos à casa do Cauê, desci para o acompanhar. Despedimo-nos da Soraia que permaneceu no carro, seguindo para sua casa logo em seguida. Parados em frente ao portão, dei um abraço em meu mais novo namorado. Nossos corpos juntos, sentindo o calor de sua pele faziam-me um bem enorme, como um remédio para as soluções dos meus problemas.
            Tocando em meu rosto o Cauê disse com a voz embargada:
-Tom... Eu quero ser seu... Só seu... Por completo...
-Você já é meu desde quando te tirei daquela piscina...
            Encostei-me à parede e recomeçamos a nos beijar. Suas mãos exploravam minhas costas com suaves toques, caricias leves que me faziam arrepiar. No intervalo de um beijo e outro olhei no relógio e já passava da meia noite.
-Caramba!
-O que foi?
-Já são meia noite e quarenta... Como vou embora agora?
-Não vá... Durma aqui comigo...
-Dormir aqui?
-É...
-Mas sua mãe...
-Ela não irá se importar... A gente explica a causa para ela amanhã...
-Bem... Então tudo bem... Só vou ligar para minha mãe e dizer que não dormirei em casa.
-Sim, meu amor.
            Telefonei para minha mãe e avisei que não dormiria em casa. Embora não fosse muito favorável à ideia, não restou outra alternativa, pois não havia mais transporte pelo horário e ir até lá me buscar seria difícil pelo fato de já ser noite e ela não conhecer a região.
            Ao entrarmos, seguimos direto para a cozinha. Puxando uma cadeira o Cauê perguntou-me:
-Amor... Você está com fome?
-Um pouco.
-Minha mãe deve ter deixado algo pronto aqui... Você pode ver se está dentro do micro-ondas?
-Claro, mozinho.
            Abri a porta do micro-ondas e logo avistei metade de uma torta de frango que parecia estar com uma cara ótima.
-Meu príncipe... Tem torta de frango...
-Oba! Esquenta pra mim, por favor?
-Claro!
            Enquanto a torta aquecia, eu e o Cauê arrumávamos à mesa para jantarmos. O silêncio da madrugada me fazia um bem enorme, em todos os sentidos, levando-me a um estado de paz.
            Sempre quando eu me sentia sozinho, subia no telhado e passava a madrugada inteira pensando na vida, enquanto a cidade continuava trabalhando sem parar. As luzes dos grandes prédios formavam um lindo cenário, abrigando meus pensamentos e acolhendo-me nos meus momentos de tristeza.
            Sentados à mesa, jantávamos a torta de frango, que por sinal estava maravilhosa quando o Cauê disse:
-Está ouvindo esse barulho?
-Que barulho?
-De carros.
-Não ouço barulho algum...
-É porque está bem baixinho...
-Certamente.
-Esses carros devem estar bem longe daqui...
-Bota longe nisso.
-Sabe que eu adoro esse barulho de São Paulo?
-Sério?
-É... Barulho de cidade grande à noite...
-Hum... Eu também adoro!
-Enquanto alguns dormem, outros trabalham...
-Pois é. Essa cidade não para.
            Após dar um gole em seu suco de abacaxi o Cauê perguntou:
-Tom...
-Hum?
-Como é à noite?
-Em que sentido?
-Todos!
-Bem... A noite é escura, mais fresca...
-É muito escuro?
-Não. A lua ilumina parte dela, mas não como o sol faz com o dia.
-Ah!
-Durante a noite o céu fica coberto de estrelas...
-E como são as estrelas?
-Lindas! Brilham bastante, cobrindo com beleza nossos telhados.
-Eu lembro que na escola aprendi que elas ficam muito longe da Terra.
-Isso é verdade.
-Devem ser lindas mesmo.
-Seu eu pudesse te daria de presente.
-Deus já me deu o melhor presente do mundo: você.
            Naquele momento toquei em sua mão, sentindo-me o cara mais feliz do mundo. O Cauê foi um presente de Deus, e juntos viveríamos para sempre, unidos pelo sentimento mais nobre do mundo que é o Amor.
            Após jantarmos, seguimos para seu quarto, pois meus olhos já estavam pregando de sono. Fechei a porta assim que entramos. A janela de seu quarto estava aberta, deixando o ambiente bem agradável e fresco.
            Depois de colocar um CD pra tocar o Cauê sentou-se em sua cama, e tirando seu tênis ele falou:
-Você se importa de dormir em minha cama?
-Não se preocupe, mozinho... Eu posso dormir no tapete mesmo.
-Por que no tapete?... Você é meu namorado, pode dormir comigo. Ao menos que você não queira.
-Não quero dormir com você.
-Não?
-Não só dormir, mas também acordar, tomar banho...
-Hum... E fazer amor?
-Também!
            A luz do quarto já estava apagada quando o Cauê tocou em minha mão e pediu:
-Tom, me beija?
            Silêncio entre nós. Fechei meus olhos e iniciamos nosso beijo, um beijo único, singular. Apenas nossos corpos falavam, acompanhados pelas fortes batidas de nossos corações.
            De fundo o barulho da cidade se misturava ao som de Não vá embora – Marisa Monte. Abraçados, nos deitamos. Suas mãos tocavam minha face como se pudessem enxergar minha alma, meus pensamentos, enquanto a letra da música falava por nós.

Não Vá Embora

E no meio de tanta gente eu encontrei você
Entre tanta gente chata sem nenhuma graça, você veio
E eu que pensava que não ia me apaixonar
Nunca mais na vida

Eu podia ficar feio só perdido
Mas com você eu fico muito mais bonito
Mais esperto
E podia estar tudo agora dando errado pra mim
Mas com você dá certo

Por isso não vá embora
Por isso não me deixe nunca nunca mais
Por isso não vá, não vá embora
Por isso não me deixe nunca, nunca mais

Intérprete: Marisa Monte
Composição: Marisa Monte

            Sussurrando ele falou em meu ouvido:
-Faça-me feliz, Tom?
            Depois de um intenso suspiro, respondi:
-Como?
-Torne-me seu... Por completo.
            Com sua mão direita ele tocou em minha esquerda e a levou em direção ao botão de sua calça. Voltei a beijá-lo, sem questionar mais nada. Peça por peça fomos nos despindo, até ficarmos totalmente nus. Abraçados, podíamos sentir as batidas do coração um do outro.
            Eu já transei com outros meninos anteriormente, mas nunca havia sentido satisfação como aquela, um estado de felicidade plena.
            Ao tocar em sua cintura, o Cauê falou:
-Preciso te dizer algo...
-O quê?
-Eu... Eu nunca fiz...
-Você é virgem?
-Sim...
-Oh!
-Decepcionei você?
            Respondi primeiramente com um beijo em sua testa.
-Claro que não... Você é muito especial, sabia?
-Eu amo você, Tom!
-Também te amo.
            Nossos lábios se tocavam carinhosamente, em um beijo calmo, molhado e repleto de sentimento sincero. A sensação que eu vivia naquele momento jamais sentira antes, impossível descrever.
            A noite estava linda. O vento fresco que entrava pela janela refrescava-nos do suor provocado pelo clima que rolava no quarto, e a luz da lua, que ao tocar nossas peles recarregava nossas energias consumidas no momento em que fazíamos amor.
            Nossos corpos pela primeira vez sentiram um ao outro, em um verdadeiro e profundo toque de pele. Sem pelos, trocávamos suores e beijos, que se tornavam cada vez mais intensos.
            Aquele foi o melhor momento da minha vida, inesquecível, único, mágico, eternizado por nós, tendo apenas as paredes brancas de seu quarto como testemunha.
            Enquanto fazíamos os movimentos pélvicos, dei-lhe um beijo na testa e perguntei em seguida:
-Está tudo bem, mozinho?
-Sim... Você é maravilhoso...
-Qualquer incômodo, você me avisa.
-Tá bem.
            O abracei forte, compartilhando as batidas dos nossos corações. Nossas peles respondiam na mesma intensidade, cúmplices, em busca do prazer mútuo.
            Fizemos amor, como eu nunca havia feito na vida. Aquela noite eu me realizei, descobrindo algo que até então eu não conhecia.
            Com sua cabeça apoiada ao meu peito e o lençol nos cobrindo até a cintura ele disse:
-Obrigado!
-Pelo quê?
-Por me proporcionar um momento tão mágico como esse...
-Não precisa agradecer...
            Dei-lhe um beijo na testa e o abracei forte. Assim adormecemos. É impossível descrever a sensação que se sente ao fazer amor com quem a gente ama. Sozinhos naquele quarto compartilhamos sonhos, carinho, dividimos prazeres, nos tornamos um só corpo, uma só alma.  
            No outro dia acordamos por volta das nove da manhã. O cheiro de café já se espalhara pela casa, despertando em nosso estômago uma euforia quase que incontrolável.
            Acariciando meu peitoral o Cauê disse:
-Amorzinho... Dormiu bem?
-Bom dia, mô! Dormi nas nuvens, e você?
-Ainda estou sonhando... Não quero acordar tão cedo...
-Acho melhor a gente levantar...
-Também acho. Vamos tomar banho?
-Claro!
            Levantamo-nos da cama, ambos nus. De mãos dadas caminhamos até seu banheiro. Liguei o chuveiro, fechei a porta e antes de entrar na água o Cauê exclamou:
-Está fria!... Deixa mais quente, amor?
-Calmai... Pronto, já começou a esquentar.
-Tom...
-Oi?
-Como é a água?
-A água?
-É.
-Bem... A água não tem cor, é...
-Não tem cor?
-Não.
-Mas eu sempre ouvi dizer que o mar é azul...
-Sim, mas não porque a cor da água seja azul.
-Então por que é?
-Bem... não sei te explicar com detalhes, mas sei que tem a ver com profundidade, terreno, raios solares...
-Ah!... E qual é o tamanho do mar?
-Vixi... É muito grande.
-Maior que a China?
-Maior que todos os países juntos.
-Nossa! Um dia você me leva pra conhecer?
-Claro... Você nunca foi à praia?
-Não.
-Então eu te levo pra conhecer.
-Você promete?

-Prometo.