quarta-feira, 23 de março de 2016

LIVRO: PROFISSÃO AMANTE - CAPÍTULO 19



| Procurando por Vera |

             Aproveitando o frio de uma sexta-feira chuvosa, fui almoçar em uma churrascaria no Centro, sozinho. Eu havia ido lá apenas uma vez logo quando cheguei a São Paulo, mas foi o suficiente para me apaixonar pela comida servida por eles, principalmente a picanha com salada de maionese, dava-me água na boca só de pensar.
            Quando eu achava que havia encontrado um momento de paz, a Talita sempre dava um jeito de me encontrar, parece que adivinhava.
-Alô?
-Olá! Como você está?
-Até agora eu estava bem...
-Grosseiro!
-Então... Diga logo o que você quer?
-Quero a conta e a senha do Leonardo.
-O quê? - Quase engasguei.
-É isso mesmo que você ouviu. Eu sei que ele tem conta em mais de um banco, mas quero que você descubra o número da conta e a senha do Banco do Brasil, porque sei que lá é onde ele tem um valor maior.
-Mas Talita... Como que eu vou conseguir isso?
-Não sei, isso é problema seu.
-E pra que você quer?
-Isso é problema meu.
-E se eu não conseguir?
-Nem preciso dizer onde você vai parar, né?
            Antes que eu respondesse, ela desligou. A partir daquele momento eu perdi totalmente a fome. Deixei a churrascaria e fui dar uma volta pelas ruas, passando pela Praça da República, e só fui eu cruzar a Avenida Ipiranga em frente ao Edifício Itália para encontrar a Marcelina, proprietária da quitinete que eu morava no Edifício Copam.
            Querendo me provocar, ela já foi logo dizendo:
-Como essa cidade é pequena!
-Pois é.
-Sabia que eu fui atropelada?
-Sério!?
-Sim... Praga sua.
-Minha, por quê?
-Porque você queria que eu morresse.
-Claro que não.
-Não?
-Não... Acho que nem o diabo merece a senhora por perto.
            Continuei em direção à Biblioteca Mario de Andrade e a deixei falando sozinha. Tenho que confessar que na hora em que ela revelou ter sido atropelada eu tive vontade de rir, mas contive minhas emoções e não debochei. Criar atrito com aquela velha chata não iria me levar a lugar algum, e mesmo tendo me roubado como fez, não me sentia no direito de acabar com sua moral.
            Desci até a Avenida Nove de Julho e peguei o ônibus para voltar pra casa. Meu peito estava apertado, e uma vontade louca de chorar não me deixava em paz. Tirei o celular do bolso e liguei para minha mãe, porque ouvir sua voz sempre me fazia bem:
-Oi Clau!
-Tudo bem, mãe?
-Tudo, e ocê?
-Comigo está tudo ótimo.
-Filho... No mês que vem eu vô pra São Paulo ficar uns dia ai cocê.
-Sério?
-Sim...
-Nossa! Eu vou adorar, já estou ansioso, mãe.
-Já disse pra Jucinéia que eu vô, mas ela não queria deixar não.
-E quem é ela pra mandar alguma coisa? Pode vim sim, mãe. Eu cuido da senhora...
-Eu sei, Clau.
-Vou te levar pra andar de metrô, no Parque do Ibirapuera...
-Sério?
-Sim... Os ônibus daqui são enormes, mãe... Tem até televisão dentro.
-Nossa!
-Agora eu vou desligar, porque o ônibus vai entrar no túnel.
-Tá bom.
-Beijo, mãe.
-Tchau.
            Desliguei o telefone feliz da vida, contando os minutos para rever minha mãe e matar a saudade que eu estava. Não sei se era a distância, mas estava sentindo-me muito emotivo, coisa que eu não era até então, mesmo com minha mãe eu mantinha um afastamento de sentimento.
            Assim que o ônibus deixou o túnel recebi um torpedo do Leonardo dizendo:

Meu moleque! Se apronte que vou te buscar daqui meia hora, arrumei uma entrevista de emprego pra você com um colega meu.”

            Que maravilha! Finalmente as coisas em minha vida estavam dando certo. Duas ótimas notícias fizeram-me sorrir novamente naquele dia, algo que eu já havia desistido de fazer depois de falar com a Talita.
            Cheguei em casa e fui correndo tomar um banho, para quando o Leonardo chegasse eu já o estivesse esperando, mas minhas contas deram errado, e logo quando eu saia do banho o interfone tocou:
-Fale?
-Senhor Claus? O Senhor Leonardo está aqui na recepção.
-Pode deixá-lo subir.
-Tudo bem.
            Mesmo eu o tendo destratado, o Emerson continuava encanado na minha, interfonando só para ouvir minha voz.
Corri pro quarto e vesti a cueca. Deixei a porta da sala destrancada e continuei a me arrumar.
-Hum... Que cheiro bom!... - Exclamou o Leonardo caminhando em direção ao quarto.
-É que eu tomei banho.
-Hahaha.
            De frente para o espelho eu atrapalhava-me todo para colocar a gravata. Eu nunca havia usado aquele negócio antes na vida, e para ser sincero, achava horrível.
Com seu jeito carinhoso e ao mesmo tempo másculo, o Leonardo encostou seu corpo por trás do meu, dando-me um beijo na nuca. Com a mão esquerda ele acariciava minha cintura, dando alguns apertões, questionando:
-O que você está fazendo? - Perguntou pertinho do meu ouvido.
-Estou tentando dar um nó nessa gravata, mas não estou conseguindo...
-Qual a dificuldade?
-Todas. Nunca usei esse negócio...
-Deixa que eu te ajudo...
            Enquanto ele mostrava-me como dar aquele complicado nó, observava através do espelho, encantado com aquele elegante homem paciente.
-Depois que você passar aqui, dá uma volta...
-Nossa! Que coisa difícil...
-Calma, enrole um pouco mais para baixo...
-Assim?
-Perfeito! Agora é só puxar...
-Consegui!
-Uau... Parabéns!
-Obrigado.
-Vai ganhar um beijo de recompensa.
            Virando-me com uma pegada forte o Leonardo começou a me beijar. Ficamos ali nos beijando por mais de cinco minutos, abraçados, como ele sempre fazia e deixava-me louco.
            Acariciando meu rosto, ele falou:
-Eu tenho certeza que você irá passar...
-Obrigado pela força.
-Eu amo você!
Minha vontade era de dizer o mesmo, mas não consegui. Se eu dissesse, estaria sendo falso, e o Leonardo era um cara bom, não merecia ser enganado.
-Agora vamos que se não você irá se atrasar.
-Deixa eu passar um pouco de perfume...
-Não passe demais pra não irritar os outros... Vou te esperar no carro.
-Você vai me deixar no metrô?
-Não... Vou te levar até a empresa.
-Você é tão legal comigo que às vezes chego a me sentir mal... Até mesmo me questiono se mereço você...
-Pare com isso... Você merece muito mais.
            Antes de sair, olhei-me ao espelho mais uma vez, ajeitei a gravata, arrumei o cabelo e tranquei à porta. O Leonardo já aguardava por mim dentro do carro. Enquanto esperava pelo elevador, meu celular tocou:
-Alô?
-Que demora!... Cadê você?
-Estou aguardando o elevador...
-O que acha de descer pela escada?
-Tô indo.
            Desci correndo e em menos de cinco minutos eu já estava dentro de seu carro. Respirei fundo e coloquei o cinto. Após acionar as travas, o Leonardo subiu os vidros e deu partida.
Seguíamos para a empresa onde aconteceria à entrevista, quando seu celular começou a tocar. Como ele estava dirigindo não poderia atender, sendo assim, atendi por ele:
-Atende pra mim, meu moleque?
-Sim... Alô?
-Alô... Quem está falando?
-É o Claus.
-Mas o que você faz com o celular do Leonardo? - Perguntou a nojenta da Talita.
-Quem gostaria de falar com ele? - Questionei tentando disfarçar.
-Você sabe quem está falando. Passe logo esse telefone pra ele.
-É que no momento ele está dirigindo.
            Curioso, o Leonardo quis saber:
-Quem é?
-Sua ex... Talita. - Respondi tapando o telefone.
            Encostando o veículo, ele estendeu a mão dizendo:
-Pode deixar que eu falo com ela.
-Tá bom.
-Alo?
-Leonardo, preciso falar sério com você.
-Precisa ser agora?
-Não. Mais tarde eu passo na sua casa para conversarmos.
-Tudo bem.
-Até mais.
            Após um profundo suspiro, o Leonardo desligou o telefone e entregou-me. Percebi uma certa preocupação em seu olhar. Intrigado, resolvi perguntar:
-Aconteceu algo?
-Ainda não sei... Mas sempre que ela me liga, é porque algo ruim aconteceu.
-E ela não falou o que era?
-Não. Disse que vai passar em casa para conversarmos.
-Tanto mistério...
            Depois de me deixar no local da entrevista, o Leonardo seguiu para sua casa, onde iria esperar pela bruaca da mãe de seus filhos.
            Pouco tempo depois de estacionar o carro na garagem, a Talita chegou, acompanhada da babá e sua filha Giovana.
            Ao ver a garota, imediatamente o Leonardo questionou:
-Por que a Giovana não está na escola?
-Esse é o problema. - Respondeu acionando o alarme do carro.
-Oi papai!
-Oi minha princesa! Vem dar um beijo no papai...
            Sorrindo, ela correu para abraçá-lo. Todos entraram na casa. Enquanto a Cláudia fechava a porta da sala, a Talita falou:
-Cláudia... Leve a Giovana para brincar no jardim.
-Sim, senhora. Vamos lá, Gi?
            Ainda no colo do Leonardo, ela perguntou:
-Papai... Eu posso brincar na piscina?
-Pode, mas não fique muito tempo no sol.
-Tá bom.
-Afff... Ter pai dermatologista é um martírio...
-Cláudia, cuide dela e não deixe de passar protetor solar.
-Pode deixar, doutor.
            Enquanto as duas subiram para vestirem-se, a Talita e o Leonardo ficaram na sala, discutindo problemas familiares.
-Ai que calor! - Disse ela sentando-se ao sofá.
-Então... O que você queria tanto falar comigo?
-Credo! Não vai nem me oferecer uma água?
-Você fala como se estivesse na casa de estranho... Andreza!... - Gritou para a empregada.
-Chamou, doutor?
-Traga um copo com água pra Talita.
-Gelada, senhora?
-Sim, e com três gotas de limão.
-Certo.
            Cínica, perguntou com a maior cara de pau:
-E a Vera, Leonardo?
-Sumiu.
-Sumiu? Como assim?
-Não sei... Simplesmente desapareceu sem dar notícias.
-Que estranho!
-Estranho é ter desaparecido um quadro meu no mesmo dia.
-Já entendi tudo... Que bandida!
-A polícia já está investigando, mas até o momento nenhuma pista. Então... A que devo sua ilustre presença? - Questionou o Leonardo ironizando.
-Sem ironias, Leonardo... Você percebeu que a Giovana está diferente?
-Diferente como?
-Sei lá... Notei que ela está estranha. Hoje não quis ir para o colégio, chorou, grudou na porta do elevador e não soltou mais...
-E foi a primeira vez?
-Que ela fez escândalo?
-É.
-Sim, mas está sempre criando caso pra não ir.
-Ué... Desde quando está acontecendo isso?
-Não sei, mas não faz muito tempo. Na verdade, quem percebeu primeiro foi a Cláudia que logo comentou comigo...
            Nesse momento a Andreza apareceu na sala, trazendo a água com limão que a dondoca pediu. Ao mesmo tempo em que a Giovana e a Cláudia desciam do quarto para irem à piscina.
-Sua água, dona Talita.
-Obrigada!
            Correndo, a Giovana passou pela sala. Levantando-se do sofá, a Talita colocou o copo sobre a mesa e disse:
-Bem, agora eu vou indo.
-A Giovana vai ficar aqui?
-Sim... Hoje já é sexta-feira, de qualquer forma ela terá que vir amanhã.
-Então tá.
-Depois peça para que a Cláudia vá buscar o Artur no colégio e trazer direto pra cá.
-Tá bom.
            Após fechar à porta, o Leonardo foi até a raia da piscina, chamou discretamente a Cláudia e questionou:
-Cláudia...
-Oi?
-A Talita comentou que você percebeu um comportamento estranho na Giovana...
-Ah! Sim, é verdade.
            Acenando para sua filha, o Leonardo perguntou:
-O quê de fato?
-Bem... Toda sexta-feira ela cria caso para não ir ao colégio.
-E que aula tem às sextas?
-Educação Física e Matemática...
-Estranho... Ela sempre gostou dessas disciplinas.
-Pois é... Reparei também umas marcas roxas em seu braço.
-Hematomas profundos?
-Não... De leve, mas que não tem como passarem despercebidos.
-Será que ela andou brigando com alguém?
-Difícil pensar isso. Ela é uma menina muito calma.
-Depois vou telefonar na escola e perguntar pro professor dela.
            Enquanto isso, minha entrevista de emprego foi super rápida, pois logo fui eliminado quando me perguntaram se eu tinha nível superior, e a resposta foi NÃO. Achei um tremendo preconceito no início, proferi todos os palavrões que eu conhecia durante o caminho, mas após muito refletir, cheguei a conclusão de que o culpado da situação era eu mesmo. Aqueles que deixam de se atualizarem, acabam ficando para trás no campo de trabalho. Sendo assim, eu não tinha o direito de ficar encontrando culpados pela minha desgraça, quando na verdade a responsabilidade era toda minha.
            Sai daquela empresa arrasado, me sentindo um nada. Telefonei para o Leonardo em seguida para dar a notícia.
-Alô?
-Oi... Tudo bem?
-Alguns problemas, mas nada grave. E você?
-Não muito bem...
-Que desânimo é esse?
-Fui descartado.
-Mas já sabe?
-Sim... Eles queriam alguém com nível superior...
-Bom... Acho que você terá que pensar em começar uma faculdade então.
-Mal tenho grana pra me sustentar.
-Tenta em uma pública.
-Hahaha... Você tá me gozando, né?
-Por quê?
-Cara... É muito difícil...
-Mas não é impossível. Eu passei, você também pode.
-Depois pensarei nisso.
-Está indo pra casa?
-Estou.
-Quer que eu vá te buscar?
-Não precisa...
-Tem certeza?
-Tenho.
-Hoje as crianças estarão aqui.
-Mas já?
-Sim... Depois te conto o problema que aconteceu.
-Tá bem.
-Eu quero te ver hoje mesmo assim.
-Passa em casa depois.
-Você não tá legal, né?
-Não muito...
-Já sei! Vamos em uma balada, dançar, beber um pouco. O que acha?
-Tá bem...
-Passo em sua casa mais tarde.
-Tá.
-Então tá. Um beijo grande nessa boca linda.
-Beijo.
            Desliguei o telefone e entrei logo no primeiro ônibus, arrasado, sem rumo. Bem dizia meu pai que quem não tem estudo, não tem nada, e naquele momento comecei a temer pelo meu futuro, um destino incerto.

A década de 90 é um divisor de águas nas trajetórias dos principais indicadores da situação do trabalho no Brasil. Após cinquenta anos de progressivo aumento no trabalho assalariado e formalização das relações de trabalho, houve uma drástica regressão no mercado de trabalho, com aumento de todas as formas de desemprego, aumento dos vínculos vulneráveis, queda dos rendimentos reais e concentração da renda. (DIEESE, 2002)

            O mercado de trabalho vem mudando cada vez mais rápido, exigindo mais e mais. Para tudo existe uma solução, porém, é preciso raciocinar antes de mais nada. Em primeiro lugar, deve-se pensar em qual área quer seguir, traçando um objetivo. Ninguém se inscreve numa olimpíada sem ter condições de chegar ao primeiro lugar. Sendo assim, é importante a qualificação na área que se quer seguir, para assim, encarar o mercado de trabalho por igual.
            Passei o resto do dia triste, deitado no sofá olhando pro teto, pensando naquela droga de vida que eu estava levando, sem perspectivas. Justo naquele momento em que tudo estava indo tão bem, eis que algo dá errado. Claro que a opção de mudar estava em minhas mãos, pois acredito que cada ser é dono de seu próprio destino, e eu tinha que mudar o meu.
            O relógio da sala marcava vinte e duas horas. Eu já havia tomado banho e me arrumado, para quando ele chegasse não precisássemos esperar muito. Apaguei a luz do quarto. Segui pra sala. Deitei-me ao sofá e continuei aguardando, ansioso.
            Eu não estava muito contente em ir à balada acompanhado. Todo mundo ali já me conhecia, pois eu era o cara mais rodado daquele lugar, embora já fizesse um bom tempo que não dava as caras por ali.
            Assim que chegou, o Leonardo nem desceu do carro. Mandou-me um torpedo dizendo que estava a minha espera, e assim que recebi a mensagem no celular, desci para encontrá-lo.
            Entrei em seu carro que estava parado na quadra de cima. Nos cumprimentamos com um beijo e um apertado abraço. Que delícia! Naquela noite ele estava lindo, mais lindo do que qualquer outro dia em que nos encontramos. Perfumado, cabelo arrepiado, parecia mais jovem do que eu.
            Chegamos à balada por volta dás duas da manhã, pois no meio do caminho parávamos algumas vezes para namorarmos um pouco. Safado! Provocava-me o tempo todo, e eu adorava.
Entramos de mãos dadas. Confesso que não me incomodei com esse detalhe, pelo menos dessa vez. Pode ser que não, mas acredito que fiz aquilo por estar acostumado com aquele chato, ou até mesmo para não contrariá-lo.
            Abraçando-me por trás, o Leonardo beijava-me o pescoço, me fazendo arrepiar. Caralho, que tesão! Naquela noite ele estava muito provocante, safado, uma delicia. Beijamo-nos por um bom tempo, sentados a uma das mesas no mezanino. Nem preciso dizer o quanto a balada estava bombando, e claro, os olhares de algumas pessoas para mim. Para ser sincero nem me importei, fiquei na minha, aproveitando a boca e as bebidas do Leonardo.
Levantando-me um pouco, falei:
-Preciso ir ao banheiro.
-Tá bom. Enquanto isso vou te esperar lá no bar.
-Tudo bem.
Desci até o banheiro. Usava o mictório quando um cara que eu já havia ficado pegou no meu pau dizendo:
-Saudade de você, tesão!
Afastei-me na mesma hora. Encurralando-me à parede, ele perguntou com sua boca próxima a minha:
-Não vai me dizer que você não sente falta das nossas transas?
Dei-lhe um empurrão dizendo:
-Deixa de ser vulgar, garoto... Quer saber? Não sinto um pingo de saudade. Pra falar a verdade, até me arrependo de ter levado você para minha cama.
Emputecido, gritou:
-Você nem é tudo isso, seu bosta!
Apoiando-me à porta, falei antes de sair:
-O dia em que você me provar sem estar bêbado, terá outra opinião. Mas como esse dia nunca chegará, fique na vontade.
Dirigi-me ao bar e o deixei falando sozinho. Ao aproximar-me do Leonardo, notei que um rapaz havia chegado nele pra trocar ideia. Avancei lentamente, observando atento a sua reação, que até então, não havia me visto.
-Engraçado, eu nunca te vi aqui... - Disse o cara aproximando seu corpo ao do Leonardo.
            Dando um gole em sua água com gás, o Leonardo respondeu:
-Não sou frequentador de balada.
-Ah!... Achei você muito bonito... Interessante.
-Obrigado!
-Qual sua idade?
-42.
-Hahaha... Fala sério, vai?
-Eu estou falando sério...
-Caraca! Você dorme no formol?
-Por quê?
-Jamais eu te daria 42 anos... No máximo 30.
-Vou considerar isso como um elogio.
-Não... É a mais pura verdade... Não sei por que um cara como você pode estar sozinho.
-Mas eu não estou sozinho.
-Não?
-Não!
Nesse momento aproximei-me deles, abracei o Leonardo e falei:
-Voltei, mô. Demorei?
-Não... - Respondeu dando-me um selinho.
Puxando pelo seu braço, perguntei:
-Vamos pra pista?
-Vamos.
Tocando o ombro do garoto, o Leonardo disse:
-Tchau... E boa sorte aê.
Desapontado, ele respondeu:
-Obrigado.
Seguimos para a pista, onde dançamos por menos de cinco minutos até voltarmos pro mezanino. O tempo todo o Leonardo exibia um sorriso no rosto. Até que começou a me incomodar.
            Encostando-me ao encosto da cadeira, cruzei os braços e perguntei:
-Posso saber do que você tanto ri?
-Porque estou feliz...
-Feliz com o quê? A cantada daquele cara? - Questionei furioso.
-Não... Com sua reação de ciúme.
            Debrucei-me sobre a mesa e disse:
-Ciúme? Eu?
-É... Demonstração de que gosta de mim de verdade...
-Ciúme... Convencido!
De fato, foi a primeira vez que tive vontade de bater em alguém que dava em cima do Leonardo. Será que isso era ciúme? Caramba! Se ele estivesse razão, eu estava perdido.
            Por volta dás quatro da manhã deixamos a balada e seguimos para sua casa. Ao chegarmos, fomos direto tomar banho. Começamos a nos amar ali mesmo, em meio a espuma do xampu. Que loucura! A mão que deslizava pelo meu corpo sem pelos, enquanto nossas bocas, unidas, pouco nos permitia respirar. Cada dia que passava inventávamos algo novo.
O que começamos no chuveiro, continuamos na cama. Sua pele tocando à minha, estava causando-me arrepio. Cada dia que passava, o Leonardo estava cada vez mais gostoso, carinhoso, atencioso.
            Após fazermos amor, nos abraçamos e depois de dar-lhe um beijo na testa, disse sem querer:
-Te amo!
Sorrindo, ele mal acreditou:
-O quê? - Perguntou olhando-me profundamente nos olhos.
-Desculpa.
-Não... Repete?
-Pra quê?
-É a primeira vez que você diz que me ama...
-Eu disse?
-Você acabou de dizer.
Naquele momento eu fui me dar conta de que o Leonardo não estava mais carinhoso do que já era, nem mais gostoso. Era eu que estava apaixonado. A Talita tinha razão, assim como o Emerson. O que não deveria acontecer, aconteceu. Droga! Como eu poderia me apaixonar por um cara cujo estava tentando destruir sua vida?
            Minha cabeça estava confusa, mas de qualquer forma, eu queria aproveitar aquela sensação da qual eu jamais havia provado antes, e estava gostando.
            Enquanto dormíamos, abraçados, sua carteira estava ao meu alcance. Cheguei a levantar-me para pegá-la, mas na hora não tive coragem. Pra que fazer aquilo? O dinheiro era do cara, e se trabalhou para conseguir, ninguém tinha o direito de roubar, e se eu passasse aqueles dados pra Talita, eu seria um ladrão, mau caráter, tanto quanto ela.
Por mais que eu tentasse não pensar, um peso na alma tirava-me a paz. Toda vez que o Leonardo me tocava, beijava, e eu correspondia, não estava sendo verdadeiro. Olhar em seus olhos eu já não conseguia mais, pois o sentimento que se abrigou dentro de mim transformou-me por completo numa pessoa totalmente diferente do que eu era, pra melhor, claro.


Próximo capítulo:      | Descobri que te amo |
Dia 24/03



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